OPINIÃO Roger e Rúben: tiro no pé
A melhor posição para liderar não é marchar à frente da multidão, muito menos atrás. É marchar no meio da multidão.
Não sou adepto das teorias da conspiração, mas se eu fosse Roger Schmidt e ainda treinasse o Benfica na próxima época, haveria de meter baixa nos jogos com o Farense. Na Luz e em Faro, insultos, monumentais assobiadelas e lançamento de objetos contra o próprio treinador. Inacreditável!
Roger Schmidt não está a perceber muito bem o que se está a passar. E Rui Costa? Suspeito que possa estar a perceber melhor do que pode admitir em público. É que esta contestação é muito desproporcional ao simples descontentamento com a escolha do onze, substituições feitas ou ausência de títulos esta época. É uma reação de ódio visceral, uma urticária insuportável. Os que passaram das marcas de forma condenável podem estar em minoria, mas não são meia dúzia de gatos pingados. E mesmo a maioria que é ordeira, que se fica pelo assobio, quer ver Schmidt pelas costas.
Antes de se criticar os adeptos, saber se têm ou não razão, há que perceber como se chegou aqui. Porque mais do que as opções, resultados ou ausência de títulos, o que os adeptos não toleram é o próprio Schmidt. Não suportam o discurso, a linguagem corporal, a falta de empatia com o sofrimento deles, a ausência de um simples esgar de dor e inconformismo; a ausência de autocrítica, e, cereja no topo, a acusação de que os contestatários não são benfiquistas e o convite para que fiquem em cada se não for para apoiar. Se Schmidt acredita que pode vencer uma multidão... boa sorte.
Roger Schmidt não tem de mudar e ser o que não é só para agradar aos outros. Sendo assim, também não pode esperar ser amado. E não há drama nisso. Os casamentos também acabam. O ideal é que acabem enquanto não se quebrar o respeito entre os membros do casal.
E agora, Rui Costa?
Rui Costa demorou 24 horas a reagir. Desta vez, apenas censurou o comportamento dos adeptos, não fez uma defesa acérrima de Schmidt como tinha feito após o Benfica-Farense. E tem uma decisão tremenda para tomar: mantém ou demite o treinador? O primeiro critério tem de ser o da sua própria convicção sobre a competência de Schmidt e se continua a fazer sentido para o projeto que defende. Mas este critério não é absoluto. Nenhuma empresa contrata ou mantém alguém em funções de liderança apenas com base na competência técnica. Questões como empatia, identificação com a marca, capacidade de mobilizar colaboradores e de seduzir os clientes são igualmente ponderados e decisivos. O mais competente do mundo sem o resto vai bater contra uma parede; ter tudo o resto sem competência é navegar sem rumo.
Seria um erro Rui Costa decidir apenas em função dos adeptos. Mas também seria um erro decidir sem pensar nos adeptos. Ajudaria que Schmidt desenvolvesse técnicas de empatia. Os adeptos podem não ter sempre razão, embora tenham mais vezes do que se pensa, mas têm emoção. Quem melhor controlar essa emoção sem abdicar de princípios básicos mais sucesso terá. Por isso, um líder não deve marchar à frente da multidão, que ficaria de costas e pode desistir de o seguir ou pior, passar-lhe por cima; muito menos menos deve marchar atrás, onde o populismo se paga caro; tem de estar sempre a marchar no meio. Onde de facto se sente o pulsar e se mobilizam as pessoas.
Rúben não merecia ser acusado de contradição
Semanas que antecedem os jogos no Dragão começam a ficar marcadas por casos em Alvalade. Ou foi a venda de Matheus Nunes a dias do jogo; ou a venda de Pedro Porro ao Tottenham, tendo aqui o Sporting conseguido que o lateral espanhol jogasse; ou agora a ida de Rúben Amorim a Londres para falar do futuro com o West Ham... E neste último caso, um raro tiro no pé por parte do treinador do Sporting. Por quatro razões:
1 — Rúben garantiu: «Estou apenas focado no título. Enquanto não atingirmos esse objetivo, não há conversa com ninguém». Logo, a viagem acaba por ser uma contradição entre palavras e atos;
2 — Ruído desnecessário na semana do clássico no Dragão. Vai falar-se muito mais do futuro de Rúben Amorim do que do jogo;
3 — Nada do que Rúben conversou em Londres não poderia ter sido conversado em Lisboa ou online;
4— Fica a ideia — que pode ser injusta mas é legítima até ouvirmos a versão de Rúben Amorim, versão que o próprio decidiu apenas dar no sábado — que a viagem serviria mais para pressionar o Liverpool do que assinar pelo West Ham. Seria uma pena, e provavelmente injusto, pensar-se que Rúben Amorim pensou mais em si que no Sporting.
A boa notícia para os adeptos leoninos é que quer o West Ham quer o Liverpool se estão a virar para outras hipóteses...