Quem não reclama não mama?
Creio pertencer a Miguel Sousa Tavares a expressão «Calimeros» para classificar, no caso concreto, os sportinguistas que se queixavam recorrentemente de arbitragens nos anos dos jejuns leoninos (foram duas séries longas, não me recordo em qual delas o termo foi utilizado).
A imagem é feliz, até porque nos lembramos (os mais velhos pelo menos) do pintainho choroso que clamava com olhos dengosos a máxima de «C'est une injustice pour moi».
A única falha na análise, creio, é que Miguel Sousa Tavares na verdade se referia aos três clubes ditos grandes, cada um a seu tempo, consoante a maré de vitórias ou derrotas. Se não referia, devia.
Porque esta é a cultura que temos em Portugal. Deixando o pé libertar-se do salto alto e resvalar disfarçadamente para o chinelo, diria que no futebol nacional reina o paradigma do «quem não chora não mama». É uma teoria pediátrica interessante, que não deixa de ter o seu fundamento prático. Pode estar desatualizada ou não, mas ainda serve pais e mães.
Os clubes ditos menos grandes também tentam chorar, quiçá até gritar, mas têm menor espaço mediático, pelo que são pouco ouvidos. Aliás, os clubes ditos não grandes tendem a imitar os ditos grandes em quase tudo, algo que nem sempre lhes traz bons resultados, mas isso são contas de outro rosário.
Quando o VAR foi instituído, quisemos quase todos achar que terminariam os erros de arbitragem nos campos de futebol. Obviamente houve quem alertasse para o facto de haver uma apreciação humana por cima de outra (a do VAR sobre o árbitro), pelo que a subjetividade estaria sempre presente. Houve, até, quem avisasse que só caminhávamos no sentido de criar outra camada de «suspeitos», perante a forma como adeptos, jogadores, treinadores e dirigentes olham para o jogo.
Por mais revisões de VAR que haja ou não, cada um vai continuar olhar para os lances com o par de óculos vermelho, verde ou azul que decidiu usar. Deve ser isto razão para acabar com a tecnologia? Não — o rácio entre decisões acertadas e não acertadas é tão abismal que nem os mais fanáticos poderão contestar a sua existência. Vai continuar a haver erros? Sim — enquanto houver intervenção humana haverá erro. E ainda bem! Que seria da Humanidade sem os erros que cometeu e foi sabendo corrigir?
Enquanto isso, quem reclama acha que vai mamar. Isso é o mais lamentável.