Que raio de auditoria!
Para quem trabalha no meio, torna-se evidente concluir que a auditoria visou nomes específicos e conectados a Luís Filipe Vieira
Na edição impressa de A BOLA de 28 de agosto de 2020, em plena campanha eleitoral do Sport Lisboa e Benfica, escrevi nesta mesma coluna, sob o título E o Maestro?, que Rui Costa era figura incontornável do universo benfiquista e reunia as condições exigidas pelos estatutos para a presidência. Mas sob uma condição: tinha que deixar de ser um apparatchik.
Nesse mesmo texto, aproveitei para tecer uma consideração final sobre o atual presidente da Benfica SAD: que se quisesse e tivesse vontade de ir a jogo por ele próprio, bastaria acordar a tempo de utilizar a sua gigantesca imagem aos olhos dos benfiquistas para criar um problema à lista de Luís Filipe Vieira que se encontrava em construção.
Optou por se manter fiel a quem lhe abriu as portas do dirigismo sem que lhe fosse exigida qualquer preparação, pensando que a experiência de sucesso enquanto profissional de futebol lhe chegasse para a viagem em que iria embarcar.
Ora, a pessoa que lhe estendeu a passadeira dos relvados diretamente para um dos gabinetes da SAD no piso 1 do Estádio da Luz pouco percebia do setor desportivo e nunca teve intenções de o proteger. Quis utilizá-lo, apenas e só, como trunfo eleitoral. E, sim, Rui Costa devia ter sido protegido no início da sua carreira de dirigente (como qualquer outra figura com o seu peso institucional), tal como, mais tarde, devia ter tido noção de que se devia ter protegido.
Escolheu o caminho errado (decisões essenciais tomadas no passado moldam-nos para sempre o futuro), colocou-se a jeito et voilà: quatro anos depois, analisamos uma auditoria que é um rascunho por editar ao ponto da sua própria criadora assumir, veja-se bem, que não realizou qualquer verificação sobre a autenticidade da documentação que lhe foi entregue e, no caso das cópias com que basearam o trabalho, nem sequer verificaram a sua conciliação com os respetivos originais.
Para quem trabalha no meio, torna-se evidente concluir que a auditoria visou nomes específicos e conectados a Luís Filipe Vieira. A lógica é simples: está queimado e é um alvo mais fácil a abater. Esta ilação é legítima quando somos surpreendidos com uma auditoria de transações de direitos económicos e desportivos de apenas 51 jogadores em 176 possíveis entre as épocas 2007/08 e 2022/23. A análise corresponde a uma colheita de 29%. Os responsáveis benfiquistas argumentam que só interessa auditar os casos que o Ministério Público (MP) investiga. E, segundo Rui Costa, virá uma nova auditoria relacionada com os investimentos que a sua SAD fez no passado para os lados de Setúbal. Imagino quando o MP chegar a Leixões!
Assim, apraz-me saber que Ulisses Santos, Bruno Macedo e os parceiros deste são os grandes vencedores da primeira auditoria. O primeiro, através das empresas US11, Sportis II Management e Oesterbro Services, faturou à SAD 8.658.000,00 euros. Com particular destaque para 1 milhão por diligências na venda de Raúl de Tomás ao Espanhol de Barcelona, 1 milhão pelas diligências feitas na contratação de Zivkovic, outro milhão pela celebração do 1.º contrato de trabalho desportivo de Gabriel Pires e mais 1,3 milhões pela vinda de Vlachodimos (500 mil euros) e as suas 2.ª e 3.ª renovações de contrato (400 mil euros cada).
Podia acrescentar mais diligências deste agente como a espetacular celebração de contrato com Ronaldo Camará que lhe deu 600 mil euros ou os 875 mil euros que meteu ao bolso com Pelé por uma assinatura contratual e a transferência para o Rio Ave.
Já Macedo, ex-parceiro de detenção de Vieira, foi mais recatado e ingeriu-se através de estruturas distintas como a Trade In e a Master Internacional FZC em transferências como a de Derlis González, César Martins e Claudio Correa. Neste caso, é incrível verificar que a própria auditora nem conseguiu identificar Bruno Macedo como último beneficiário efetivo da Master Internacional FZC, algo que é do domínio público.
Deve ter sido a parte feita pelos estagiários... tal como aquela em que surge o nome Ramón Daher, ex-dirigente desportivo (incluindo da Federação Paraguaia de Futebol) condenado a 15 anos de prisão em 2023 por lavagem de dinheiro.
Ao menos tiveram a noção de confirmar que houve sempre uma grande envolvência pelos vários diretores desportivos em funções em cada momento da análise.