Problema do Sporting é Rúben Amorim

Substituir um treinador com este crédito será sempre o maior desafio; saber trabalhar com ele e seus caprichos, que Hugo Viana satisfazia até ao limite, será igualmente tarefa árdua… Este é o ‘Nunca Mais é Sábado’, espaço de opinião de Nuno Raposo

O que sei é que vai ser diretor desportivo do Sporting até final da época. É o nosso diretor desportivo, vai trabalhar para o nosso clube. (…) Viana quer ganhar mais do que toda a gente ao Manchester City. Estamos todos no mesmo barco.

Acho que estamos numa fase do clube em que  já há um método, uma ideia, algum projeto, uma visão onde se pode mudar as peças. Porque é normal em todas as empresas e tudo vai seguir naturalmente.

É claro que é normal. Em qualquer empresa é normal gente entrar, gente sair, mesmo nos cargos mais altos na hierarquia. É o que vai acontecer no Sporting. Hugo Viana tem na estrutura do futebol o posto mais alto: reporta diretamente a Frederico Varandas que nele delegou a construção do plantel, em estreita colaboração com Rúben Amorim. A sintonia entre os dois é conhecida, o trabalho é de sucesso. Por isso a natural preocupação dos sportinguistas.

Porém este Sporting encontra-se num estádio de desenvolvimento que permite abalos sem que se sinta a terra tremer. Mais preocupante do que o anúncio da saída de Hugo Viana a oito meses dessa mesma saída se consumar foi na época passada Rúben Amorim ter viajado de surpresa a Londres para tratar da sua vida em fase crucial de uma temporada em que os leões lutavam pelo título. Mas o abalo causado não assustou a equipa que acabou campeã nacional. Porque realmente o clube vive «numa fase em que já há um método, uma ideia, algum projeto, uma visão onde se pode mudar as peças». E o crédito acumulado pelo treinador e pelo diretor desportivo possibilitam permitirem-se a estas situações que noutras alturas seriam crimes de lesa-clube…

O trabalho de Rúben Amorim no Sporting é o melhor que qualquer treinador fez nos últimos 70 anos. O trabalho de Hugo Viana, a forma como batalhou para dar ao treinador sempre tudo o que ele pediu, a isso ajudou… e muito. Ninguém se pode admirar por ambos serem desejados por milionários emblemas da Europa — sim, de campeonatos como a Premier League, a mais competitiva, importante e restrita do mundo e não milionários novos de outras latitudes. O novo futebol é assim, não são apenas os jogadores e os treinadores que são cobiçados mas também dirigentes, diretores.

O grande desafio do Sporting, quanto a mim, não acontece esta temporada — ou melhor, o grande desafio do Sporting fora das quatro linhas (tentar o bicampeonato será sempre grande empreitada) não está nesta temporada —, antes em 2025/2026. Porque quem vem tem herança pesada — e quem vem é o novo diretor geral do futebol, Bernardo Morais Palmeiro, o coordenador do scouting, Flávio Costa (e virá também novo treinador?...). E nisto nota-se a preocupação de Varandas em dar seguimento a uma ordem natural das coisas: Palmeiro já trabalhou três anos, até há um ano, com Viana nas negociações de transferências; Costa coordena o departamento que apresentou, por exemplo, Viktor Gyokeres e Morten Hjulmand a Amorim. Nenhum tem, porém, o tato de grande balneário que Viana tem e isso não se ganha de um dia para o outro — é aqui dúvida que me fica sobre se poderá ou não entrar mais algum elemento na estrutura que faça essa função de ligação.

Hugo Viana e Rúben Amorim sempre muito cúmplices (A BOLA)

E claro que o problema maior será com… Rúben Amorim, na hora da saída ou da continuidade: porque substituir um treinador com este crédito conquistado em títulos e bom futebol será sempre o maior desafio; porque saber trabalhar com ele e seus caprichos, e Viana sempre tudo fez até ao limite para os satisfazer, será igualmente tarefa árdua.

Quanto ao tão badalado conflito de interesses, esse tem de terminar no momento em que o jogo está aberto: toda a gente sabe, porque oficial, que Hugo Viana vai ser o novo diretor desportivo do Manchester City, toda a gente sabe que ainda vai trabalhar para o Sporting no mercado de inverno, numa eventual negociação entre estes dois clubes em janeiro naturalmente que terá de delegar as negociações. Depois de janeiro, então, o papel de Viana terá de resumir-se ao futebol que se joga, ao balneário, onde tem também grande importância. Antes, os dois clubes defrontam-se na Liga dos Campeões mas não me consta que Viana vá entrar em campo para jogar e se jogasse não seria a primeira vez que um jogador, um profissional, iria defrontar a futura equipa. Quanto ao resto, toda a gente sabe que um futuro diretor de um clube estaria sempre a preparar o terreno, como Palmeiro também estará a fazer a mesma coisa em Alvalade ainda esta época, embora só comece oficialmente em 2025/2026. Dizer que isso não seria natural é enganarmo-nos a nós mesmos.