Previsibilidade fiscal
Aos olhos da AT, do casamento entre FPF e Santos nasceu expediente de elisão fiscal
EM tom de brincadeira, manifestei curiosidade em Fernando Santos trabalhar a dobrar para a FPF. Por um lado, enquanto assalariado e auferindo um rendimento sujeito a um determinado enquadramento fiscal e contributivo. Por outro, enquanto prestador de serviços através de uma estrutura empresarial detida por si e pela sua esposa, faturando um rendimento milionário que suportava, inclusivamente, o custo dos seus adjuntos. Mal se sabia era que a FPF intencionava celebrar uma prestação de serviços desta natureza com base no eventual facilitismo que traria uma futura rescisão. Ora, aos olhos da AT, do casamento entre FPF e Santos nasceu um expediente de elisão fiscal, i.e., a utilização de um mecanismo legal para pagar menor número de impostos possível. Quer queiram, quer não, assim pareceu. Só se estranha o facto de os atores envolvidos não terem contemplado que a AT é homogénea na sua fiscalização a este tipo de práticas sobretudo quanto ao grupo dos grandes contribuintes. Podem ter preferido arriscar, até porque a FPF já assumiu em nome de Santos os impostos devidos. Abrindo a porta ao recurso, esta elisão fiscal pode ter levado a uma violação de cláusula geral anti-abuso para efeitos da Lei 32/2019 (transposta pela Diretiva Europeia 2016/1164). Nesta mesma Diretiva refere-se que as regras gerais anti-abuso deverão ser aplicáveis a montagens que não sejam genuínas. Caso contrário, Santos podia dispor do direito a optar pela estrutura mais vantajosa fiscalmente para as suas atividades comerciais. Um pouco como os agentes de futebol que faturam através das empresas. Mas eis uma questão milionária: a atividade de selecionador deve ser caracterizada como sendo de exercício puramente pessoal em que tenha que ser prestada exclusivamente pelo indivíduo (excluindo qualquer hipótese de faturação através de uma estrutura empresarial)? Em caso negativo, porque celebrou Santos também um contrato de trabalho?