Prato do dia era polvo

Ministério Público fala numa teia montada com espiões na Federação, Liga e Arbitragem. À justiça cabe demonstrar que ninguém, nem nenhuma instituição, está acima da lei! Sistema tácito é o espaço de opinião semanal do jornalista Paulo Pinto

A coincidir com o início do mandato do novo Procurador-Geral da República, o Ministério Público entende, face aos fortes indícios que apurou, que o Benfica deve ser condenado por corrupção desportiva com participação económica em negócio e fraude fiscal no âmbito do famigerado ‘caso dos emails’ e, ao mesmo tempo, sugere que seja afastado das competições desportivas por período entre os 6 meses e os 3 anos. Na génese disto tudo estará, segundo a procuradora Cristiana Mota, que contou com o apoio do Núcleo de Apoio Técnico do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, Luís Filipe Vieira e o então seu assessor jurídico, Paulo Gonçalves, que terão agilizados vários acordos entre o emblema da Luz e o V. Setúbal, que permitiam transformar verbas avultadas da SAD encarnada para a sadina a troco de favores desportivos e a votos das reuniões da Liga de Clubes.

Depois do processo 'Mala Cio' e 'E-Toupeira', o Benfica, visto por muitos como a maior instituição em solo nacional, vê-se arrastado novamente para a lama por um presidente que (sempre!) julgou ser o dono disto tudo. Não estamos a falar de um mero jogo, há transferências diretas para competidores diretos, controlo da promoção de árbitros à 1.ª categoria, espiões nas instituições de maior relevo a passarem informações secretas e, pasme-se, até um parecer encomendado a um juiz do Supremo Tribunal de Justiça de seu nome Ricardo Costa, durante anos persona non grata para Boavista e FC Porto.

Perante tamanho emaranhado de alegadas ilegalidades e atropelos, a questão agora é perceber se o Benfica está mesmo acima da lei. A instituição na altura liderada por Luís Filipe Vieira seguia uma linha condutora que extravasa a verdade desportiva para chegar ao sucesso. Mais uma bomba que rebenta no futebol português, com a Liga e a Federação a continuarem a assobiar para o lado, defendendo o oásis que, nas respetivas óticas, é o futebol português nos mais variados parâmetros.

À Justiça civil — e mais tarde à desportiva — competirá averiguar e provar em sede própria que os fortes indícios apontados pelo Ministério Público serão punidos pela lei e os prevaricadores não vão, uma vez mais, passar impunes com atos que terão lesado a verdade desportiva.

Na realidade, este processo é uma mão cheia de tudo e que se espera que, ao contrário do que sempre acontece em situações ligadas ao futebol, não se transforme numa mão cheia de nada. Que as instâncias competentes sigam o código penal e não compactuem com atividades ilícitas que mancham um desporto amado por tanta gente.

Os sócios do Benfica — que não podem dormir descansados, pois o assunto deixa-os em sobressalto permanente — estão indignados (com razão) por verem o nome do clube idolatrado manchado desta forma vil por Luís Filipe Vieira e os seus acólitos. Dir-me-ão que estão acusados e não condenados. É um facto, mas tanta alegada trapaça não pode passar sem a devida punição caso o que é relatado na acusação seja comprovado em tribunal. Pelos vistos, o polvo era uma espécie de prato do dia no reinado de Luís Filipe Vieira.

Mas, como diria Blaise Pascal, a justiça sem a força é impotente, a força sem justiça é tirana...