Pouco importa, pouco importa
Adeptos da Seleção precisam-se. Já que não há bandeiras na janela, arranje-se uma música
A poucos dias de começar o Euro 2024, o entusiasmo com uma das melhores gerações de sempre de jogadores portugueses não parece estar em alta. Não tem a ver com expectativas, que essas estão bem lá em cima, mas com um sentimento com o qual os adeptos se defrontam a cada competição como esta: quem, porquê e como se torce pela Seleção Nacional?
Lembrei-me disto a propósito de um anúncio - muito bem conseguido, já agora - dirigido a quem não sabe nada de futebol, mas que a cada dois anos vai buscar o cachecol ao armário e vai para uma praça com ecrã gigante gritar golo numa repetição. Será um mito ou já todos debatemos um pouco sobre isto? Quem torce por Portugal não liga a futebol?
Quando a Seleção venceu o Euro 2016, os portugueses - soubessem ou não muito sobre futebol - não precisaram de ser convencidos a sair à rua para celebrar. Foi o culminar de uma caminhada quase sempre desinteressante ao nível do que se jogava em campo, mas muito bem explorada pelo célebre «pouco importa, pouco importa, se jogamos bem ou mal, queremos é levar a taça, para o nosso Portugal!» Um simples cântico conseguiu com que todos se identificassem com estas palavras e - por arrasto - com a Seleção. Mas numa altura em que este Europeu ainda nem começou, como se captam estes mesmos adeptos para apoiar os comandados por Roberto Martínez?
Há quem ache que a culpa é da clubite em Portugal. Se quem liga a futebol está mais preocupado com as notícias de mercado de Benfica, FC Porto e Sporting, pouco tempo sobra para Portugal. Mas tendo a notar que os adeptos do River Plate ou Boca Juniors são ainda mais fanáticos pelos seus clubes, e no entanto é vê-los que nem loucos quando joga a seleção argentina.
E se for disso mesmo que a Seleção precisa? Fanatismo, portanto. De quem pense num Campeonato da Europa não só durante um mês, de quem analise parcialmente os jogadores, de quem defenda estas cores no café e em todo o lado com argumentos duvidosos e enviesados?
Enquanto não conseguimos decifrar o segredo, precisamos pelo menos de uma música. O «pouco importa» já não dá, que com estes jogadores todos exigem boas exibições. Lembro-me dos ingleses, em 2021, a entoarem a «Sweet Caroline» de Neil Diamond até à final e a não se cansarem de avisar que o futebol estava de volta a casa. E, durante os amigáveis, vejo os adeptos da Seleção Nacional com vergonha de cantar baixinho um «Portugal allez» como se nem o ritmo estivesse já decidido.
Fica, então, o desafio: há meia dúzia de dias para encontrar as palavras e o som que façam os portugueses entusiasmar-se com esta Seleção. Parece que pouco importa, eu sei, mas recordo que este é o último Euro de Cristiano Ronaldo e os adeptos que não percebem de futebol vão ficar sem saber sequer por quem gritar a cada toque na bola.