Opinião PC agarra-se aos árbitros
A prioridade do líder portista é garantir mais um mandato nas próximas eleições
Na arte de assobiar para o lado o presidente do FC Porto é inimitável. Não há preocupações que o assustem e essa soberba advém da correnteza de elogios, por ser o mais titulado do mundo, o que o torna imune às críticas e indiferente a quem as faz.
Na apresentação do relatório e contas de 2022/2023, com um prejuízo na ordem de 48 milhões de euros, foi astuto em desviar o foco da preocupante situação financeira do clube e falar de trivialidades, eventualmente agradáveis aos ouvidos de uma massa adepta que ouve e cala, mas completamente desajustadas do essencial do reunião.
Essas minudências sobre prejuízos e generosas remunerações dos administradores ficam para os especialistas, porque o líder portista é mais dado a golpes de asa. Assim, alvejou André Villas-Boas pela sua reiterada ousadia em admitir candidatar-se à liderança do clube nas próximas eleições (abril de 2024), convidando-o a desistir da ideia. A ele ou outro qualquer, porque a decisão final é do próprio Pinto da Costa. «Já tenho mais de 1500 dias como presidente. Há muito tempo que me querem ver longe, mas vão ter de esperar sentados, senão ainda vão ganhar varizes…», afirmou, com a ironia que ainda julga ter.
Então, e os prejuízos? Mais milhão, menos milhão, isso não interessa porque, do seu ponto de vista, aquilo que os adeptos gostaram de ouvir foi a farpa ao Sporting, a propósito das «desigualdades chocantes no comportamento dos clubes conforme de onde são». Porquê? O FC Porto apanhou um jogo de interdição porque «o indivíduo [adepto portista, presume-se] atirou um foguete ou qualquer coisa», em Moreira de Cónegos, e na final da Taça da Liga de época passada «um grupo de dez indivíduos» mandou «tochas e foguetes para cima das pessoas» e o Sporting só foi multado.
Não é o colossal défice do clube a que preside que o preocupa. Nem as comissões, nem os prémios, nem nada que tenha ver com dinheiro. O que o incomoda, pasme-se, é a «desigualdade de tratamento» aos clubes, «conforme de onde são». Aqui, porém, foi pouco original, há anos que lhe escutamos a mesma ladainha.
Este exercício grotesco de regresso ao tempo em que ao passar a ponte sobre o rio Douro em direcção a sul já estava a perder por meio a zero é sinal inequívoco de que sente mesmo necessidade de distrair a família portista com quinquilharia argumentativa e, para o naperão ficar mais colorido, nada melhor do que lhe acrescentar o encarnado, embora, confesso a minha dificuldade, não entenda qual a relação entre o gozo que dá a PC as sondagens que vê no Alentejo e a sugestão para se fazer também uma sondagem à Casa do Benfica de Paredes, uma das principais «aqui do Norte».
Era obrigatório, tinha de falar do Benfica, o campeão em título que respira estabilidade e continua a melhorar a sua organização em torno da figura do presidente, Rui Costa, mas como lhe faltou tema, inventou uma comparação sobre sondagens entre o Alentejo e a Casa de Paredes, provavelmente com culpas no buraco financeiro do FC Porto. Talvez, mas isso PC não explicou…
Há uma semana, ainda não se falava de contas, o FC Porto solicitou ao Conselho de Arbitragem da FPF uma reunião com «caráter de urgência», justificada pela «sequência de um conjunto de erros graves e reiterados que adulteraram a classificação do campeonato».
Não se discute o pedido, mas convém não ter memória curta e recordar o que se passou no FC Porto-Rio Ave da época passada (21ª jornada), em que Pepe voltou a passar por entre os pingos da chuva e o FC Porto foi presenteado com um bónus de dois pontos. A polémica foi grande e na altura, neste mesmo espaço, alvitrei a demissão de Fontelas Gomes porque um Conselho de Arbitragem que não explica, não reage e não se indigna é porque não existe.
Oito meses mais tarde, porém, há novos procedimentos e depressa foi atendida a pretensão portista. Passando ao lado das más contas, o presidente do clube anunciou que apresentou as suas ideias e a recetividade da outra parte foi boa. No entanto, enigmático e gerador de desconfianças foi o modo bajulador como fez o retrato do CA e de quem o compõe:
«Tenho a certeza de que as pessoas do Conselho de Arbitragem estão extremamente interessadas em que a arbitragem melhore, reconhecem que não está bem e são de uma seriedade intocável».
Não sei o que as pessoas do CA lhe disseram, mas alguma coisa devem ter dito para Pinto da Costa se permitir a um juízo tão amável e assertivo sobre elas. Devem ter ficado embasbacadas, acredito. De uma seriedade intocável?! Mas foram sempre ou passaram a ser a partir deste encontro?
Uma velha tática utilizada quando era preciso gerar a dúvida e confundir os árbitros acerca de quem manipulava os cordelinhos de influência nas suas classificações e carreiras. Hoje, é mais difícil, mas sobrevivem os maus hábitos.
À oitava jornada, o FC Porto é o terceiro classificado. Sérgio Conceição tem feito verdadeiros milagres, mas o quadro é complexo. Os adeptos entendem, por causa da passividade da administração é natural que as expectativas murchem, cenário que PC não vai admitir até as eleições lhe garantirem mais um mandato. Ele sabe muito, por isso devem os clubes rivais ficar atentos depois desta declaração de amor à arbitragem.