O jogo mental que José Mourinho tem perdido
O melhor treinador português de sempre continua ser perceber onde tem falhado
A ligação emocional que José Mourinho criou com a Roma é assinalável. Seriam poucos giallorossi a imaginar um dos grandes da história do jogo no banco da sua equipa e, com este a levar muito a sério o hino Roma Non Si Discute, Si Ama, valorizaram-no bem mais do que os resultados, satisfazendo-se com uma primeira taça europeia (e uma outra final), que não vale por si só uma tatuagem no braço. Claro que o valor é a complementaridade às outras duas, com outro peso, sobretudo a Liga dos Campeões, porém a sua relevância em nada condiz com o estatuto de alguém como o português.
Os adeptos romanos já tinham idolatrizado antes nomes como Zdenek Zeman e Luciano Spalletti, que não chegaram ao scudetto, feito raro a sul da Pianura Padana, ao lado daqueles que o alcançaram, o caso do húngaro Alfred Schaffer (1942), do sueco Nils Liedholm (1983) e do compatriota Fabio Capello (2001). Os cinco, ao seu estilo, acrescentaram inovações táticas, treinos divergentes e também um calcio champagne. O português tocou sempre na palavra-chave, a paixão, falando diretamente ao coração das bancadas, que, recorde-se, o apoiaram até ao fim, todavia não implementou um estilo empolgante ou chegou aos resultados esperados.
Mourinho compreende como poucos como o sistema funciona. Sabe que tem de voltar a aparecer para que não se esqueçam rapidamente dele, após os projetos falhados. Até o arqui-inimigo Guardiola já o trocou por Klopp na altura de escolher o maior rival. Não é inocente o momento, a notícia de que andará a aprender alemão ou a abrangência do discurso. No entanto, também parece que ainda não está bem consigo próprio. Continua rodeado de fantasmas, recusando-se a aceitar as evidências. Não foi eliminado por quem não percebe nada do jogo, mas por si próprio. Ou seja, por quem percebe. O futebol continuará, com justiça, a tentar que recupere o toque de Midas, mas não deixa de ser estranho que alguém tão forte mentalmente não reencontre o caminho. Mesmo que continuemos sem reservas à sua espera.
Um treinador é a soma de tudo, porém todos sabemos que a identificação com um clube pode alcançar… ou, em caso de ser um ponto frágil, desfazer. Klopp não seria o mesmo sem o pulsar da Muralha Amarela em Dortmund ou a alma da Kopp em Liverpool. Mesmo Sérgio Conceição, que, não esconde publicamente o sportinguismo na infância, foi educado na mesma resolução never say die enquanto jogador que hoje aplica no banco portista. Tudo faz sentido. Tal como Álvaro Pacheco e Guimarães: um técnico emocional para clube e cidade que transpiram Vitória.
Ao mesmo tempo, a ligação inicial criada por Schmidt com o Terceiro Anel talvez tenha resultado de uma pura estratégia comunicacional, aliada a um impacto em campo que se foi desvanecendo e, por isso, ameace fraturar-se a cada resultado menos bom. Já Amorim parece o pacote completo. Nada se sobrepõe, está tudo na dose certa.