Ninguém treina a dor
Há uns anos, poucos, Abel Xavier, na altura treinador do Olhanense, deu uma conferência de imprensa que se arriscou a ficar nos anais da história do futebol português. Suportando-se sempre do sufixo dor para várias profissões, disse que um treinador «treina a dor».
É verdade que, muitas vezes, um treinador tem de lidar com a dor dos seus atletas pelas mais variadas razões - ou porque não jogam; ou porque jogam em demasia e estão cansados; ou porque querem sair para outro lado onde poderão ganhar mais; ou porque nada ganham porque o clube não lhes paga.
No entanto, nos últimos tempos, dois técnicos lidaram com a dor, não dos seus jogadores, mas dos adeptos do clube. Primeiro Jorge Jesus, que quando o Sporting entrou numa espiral em velocidade vertiginosa para o abismo, manteve, dentro dos possíveis, a sanidade e segurou as pontas de uma direção que parecia muito mais apostada em cortá-las do que em aguentá-las.
Jesus fartou-se, saiu, foi para a Arábia Saudita e uma franja significativa dos adeptos tremeu. Mas Sousa Cinta resolveu, com paciência de ancião, colar alguns dos cacos de um plantel desfeito.
Mas, voltando aos treinadores, quem soube antecipar a dor dos adeptos foi Sérgio Conceição. Com a frontalidade dos homens simples, disse, com todas as letras, que precisava de reforços; os meios de que dispõe são curtos para tanta ambição. A frase foi escutada por Pinto da Costa, que com a sapiência de um velho lobo, aos poucos, acelera os processos e vai dotando o plantel do FC Porto de mais jogadores.
No fundo, mas bem lá no âmago, ninguém treina a dor. A principal missão é mesmo evitá-la.