Na cova do lobo não há ateus
O provérbio é húngaro, ancestral, e citado pelo escritor António Lobo Antunes nas suas últimas entrevistas. «Na cova do lobo não há ateus», diz e significa que, perante uma qualquer aflição, toda a gente recorre à fé. João Félix foi colocado na toca do lobo quando o Atl. Madrid se mostrou disposto a colocar milhões de camiões de dinheiro na sua conta bancária e ainda nas do Benfica. O menino que só para novembro chega aos 20 anos tinha outras opções e a mais confortável seria ficar na Luz mais uma época já com pré-acordo com um qualquer clube, ou em alternativa, assinar por um emblema com menos pressão, um multimilionário em que pouco se falasse do preço do seu passe - Man. City? - e sem a responsabilidade de substituir diretamente a figura da equipa nos últimos anos, no caso Griezmann. Mas quando foi colocado na toca do lobo Félix não hesitou e aceitou o desafio. Por isso, demonstrou que não é ateu. Tem fé, acredita em algo. Mais não seja, tem fé inabalável nas suas qualidades.
Mas o primeiro passo para matar o lobo é enfrentá-lo. E isso já fez. Perante a ameaça, poderia ter fugido. Louve-se a coragem.
Os mais românticos da bola argumentam que João Félix vacilou perante tanto dinheiro e que poderia ter esperado mais um pouco. Podia ser verdade. Podia, mas julgo que não é. Quem aos 13 anos sai de casa para ir viver para o centro de estágio dum grande clube, no caso o FC Porto, quando chega aos 19 tem a cabeça completamente formatada para ter sucesso desportivo e financeiro. O desportivo parece ter tudo para o alcançar; o financeiro já o alcançou. Perante a possibilidade de conseguir a sua independência financeira e dos seus no espaço de cinco anos, quem lhe voltaria as costas? Aqui não há provérbios, só há a vida. E a vida é assim.