Jogos Olímpicos: em Portugal, acreditamos em milagres
Diogo Ribeiro
Foto: IMAGO

Jogos Olímpicos: em Portugal, acreditamos em milagres

OPINIÃO31.07.202409:00

Num país onde só o futebol move multidões e fortunas, e não se chega à base da pirâmide, as expetativas são sempre desproporcionadas face às reais hipóteses de sucesso

De quatro em quatro anos, a ilusão atinge dimensões insustentáveis. Os atletas, que trabalham duramente durante o ciclo que colocam a exame, partem com malas carregadas de sonhos e expetativas. Deixam fermentar na mente a sua própria imagem num pódio com a medalha ao pescoço que os tornará heróis temporários, e não desilusão, de um país que nunca quis os conhecer, e sim, ao mesmo tempo, lendas para toda a vida para os seus, os que realmente importam. Escrevem uma estória para contar e ser recontada décadas a fio.

Muitos transportam em 100 metros, numa maratona, centenas de braçadas, em todos os golpes, histórias incríveis de superação, muitas conhecidas apenas quando atingem o objetivo e reclamam objetivas, espaço nos blocos de notas e na memória dos telemóveis ou obrigam a pesquisas que lhes dão enquadramento. Como sempre, a política recebe comitivas, oferece-lhes palavras protocolares de incentivo, posa para fotografias e selfies, e deixa, possivelmente, à comunicação do gabinete mensagens de parabéns já formatadas, com espaços em branco no nome e na modalidade, para que sejam enviadas assim que haja festa. Porque o sucesso desportivo sempre foi para os líderes, sem grandes exceções, propaganda. Todos querem estar ligados ao sucesso e afastados o mais possível do insucesso.

O resto do país programa o alarme para a primeira hipótese de medalha. Depois, para as seguintes. Acumula frustração sobre frustração, descarrega-a nas redes sociais. Não o sabe, todavia, o menos responsável é quem carregava o sonho.

Os Jogos são a expressão máxima do desporto num país onde, à exceção do futebol, não tem expressão. Há quem veja aí culpa dos jornais, e até posso admitir alguma responsabilidade, mas antes de haver réus, há primeiro que gerar interesse, como acontece em França, Espanha e por aí fora. E esse nasce de uma cultura desportiva, que ninguém soube semear.

Para um país tão pequeno e pouco populoso, a dificuldade de criar foras de série será sempre muito maior do que nas grandes potências, que têm, depois, mais dinheiro para investir e uma política estruturada. A solução está à vista de todos, exposta noutros países. Não há como não passar pelas escolas e universidades, que podem gerar mais atletas e, ao mesmo tempo, mais e melhores adeptos. Um desporto escolar forte beneficiará clubes e competitividade em grandes eventos. Enquanto não mudar o contexto, cada medalha será um pequeno milagre.