OPINIÃO João Pereira, Joe DiMaggio e Paul Newman
Nem para Ruben Amorim foi fácil quando o que fazia parecia natural. Foi sempre difícil. Como está a ser agora para João Pereira e sempre será
Numa madrugada recente na companhia de Tom Hanks, sim, o ator, talvez tenha ficado a perceber melhor como está a ser difícil o início de João Pereira como treinador do Sporting, como foi difícil para Ruben Amorim, mesmo se agora já ninguém queira saber ou mesmo se poucos tenham disso dado conta.
Contava-me Tom Hanks que certa vez estava num restaurante quando um empregado lhe disse que Joe DiMaggio, a maior figura do baseball dos Estados Unidos, queria falar com ele. Levantou-se logo e não mais se esqueceu do que ouviu depois de primeiras palavras de circunstância.
Disse Tom Hanks a DiMaggio que sempre que lhe diziam que fazia parecer tudo fácil e natural se lembrava dele, DiMaggio. E foi então que lhe respondeu DiMaggio: 'Tom, sempre pareceu fácil, excepto aqui.' E DiMaggio jogou as mãos ao coração.
Tom Hanks sublinhou o «aqui» de DiMaggio e continuou para recordar uma cena de Paul Newman no filme Road To Perdition, na qual o ator e realizador só tinha de levantar-se, dizer uma fala e fazer um brinde, perante qualquer coisa como 60 ou 70 figurantes. No fim desse take, que saiu bem, congelou e depois disse qualquer coisa que deixou todos a rir.
Mas, dizia-me Tom Hanks, até Paul Newman teve de lutar contra uma coisa que não é natural e, no entanto, quando alguém a faz suficientemente bem parece a coisa mais fácil de fazer.
Tom Hanks já não ficou para discutir os pensamentos que me conduziram a João Pereira. Certamente tinha coisas combinadas. Não bastasse ao novo treinador do Sporting assumir subitamente e sem preparação o cargo, foi substituir alguém que reconhecidamente é um exímio comunicador e que antes de sair já estava a deixar saudades pelos resultados e exibições da equipa.
Não sei — nem esse é o objetivo — se servirá de conforto a João Pereira ter conhecimento de que nem para Ruben Amorim foi fácil mesmo que o fizesse parecer.
Se em Inglaterra já anda a anunciar a chegada de tempestades, também no Sporting as viveu, apesar de agora poucos delas se lembrarem.
As comparações entre João Pereira e Ruben Amorim chegaram para ficar, chegaram para o bem e para o mal. Não há como disso fugir.
E nunca será fácil para João Pereira, mesmo quando começar a fazer parecer fácil o que é difícil. Isso acontecerá quando começar a ganhar. Esse dia chegará. E nesse momento também tudo o que disser soará como música aos adeptos do Sporting.
É difícil prever quando João Pereira terá capacidade de fazer parecer fácil o que é difícil. Tudo o que agora diz, sob o manto de duas derrotas, sob o escrutínio de figurantes prisioneiros do momento, soará sempre como um disco riscado. E, no entanto, não lhe resta outro caminho. Como não resta outro caminho a Bruno Lage ou Vítor Bruno — fazer parecer fácil o que é difícil. Talvez Bruno Lage esteja, agora, a consegui-lo fazer melhor que Vítor Bruno.
Se quiser perder um bom bocado com Tom Hanks, procure-o no YouTube, encontre-o no canal de Guy Raz e ele vai fazer-lhe boa companhia. Talvez não acabe é a pensar em João Pereira.