11 maio 2024, 13:42
Roger Schmidt: «Com esta negatividade é muito difícil o Benfica alcançar os objetivos»
Treinador das águias reitera a dificuldade de jogar ao melhor nível constantemente sob críticas
É irónico que a esmagadora maioria dos críticos da atualidade com quem falo sejam pessoas que só querem seguir em frente com as suas vidas e não precisam do Benfica para nada
Eu ainda sou do tempo em que Roger Schmidt fazia de cada vitória do Benfica uma oportunidade para demonstrar as suas qualidades de comunicador. A descer todos os golos ajudam. Hoje, pouco ou nada resta dessa imagem, tanto ao nível do futebol praticado como da comunicação. O momento que o Benfica atravessa não nos pode fazer confundir a árvore com a floresta, mas a árvore em questão está podre e aparentemente ninguém dentro do clube parece ter-se apercebido disso.
Desta vez, o ainda treinador do Benfica decidiu explicar-nos, do alto da sua condição de pedagogo de massas, qual é a fórmula que nos fará voltar a gostar dele. Segundo Schmidt, o Benfica só será campeão no dia em que formos capazes de parar o vento com uma peneira ou, se possível, quando nos convencermos de que a realidade observável é o produto de uma conspiração que tem como protagonistas os inimigos do Benfica. Os inimigos do Benfica, leia-se, são todas as pessoas que não concordam com o rumo atual. Esse caminho é claro, cristalino mesmo, pelo menos quando o vemos descrito nas notas informativas do clube, uma espécie de spin off do boletim informativo que fez escola no bas fond do clube há alguns anos, e que eu recebia religiosamente antes de cada programa televisivo em que participava.
11 maio 2024, 13:42
Treinador das águias reitera a dificuldade de jogar ao melhor nível constantemente sob críticas
Só há um problema: a estratégia de martelar parafusos poderá esbarrar numa série de problemas que a realidade teima em demonstrar. Segundo Roger Schmidt, a quem apesar de tudo reconheço a dignidade de ser o único funcionário do Benfica que atualmente dá a cara pelos insucessos do clube, há um tipo de benfiquismo que se aceita e outro que o Benfica dispensa. A tese de Schmidt começou com uns adeptos que lhe atiraram objetos e se comportaram de forma indevida, mas entretanto foi alargada para incluir quaisquer pessoas com cartão de cidadão que frequentem o Estádio da Luz e não façam vénias à sua passagem, apesar do desastre que foi esta época. O ainda treinador do Benfica disponibiliza-se para encontrar uma solução e admite que pode passar pela saída. Apetece por isso perguntar: estamos à espera de quê?
12 maio 2024, 20:45
Treinador visivelmente desgastado com as constantes críticas de parte dos adeptos; falou ainda do futuro de Di María, que diz estar «em aberto»
Pensando melhor, a pergunta anterior pode aplicar-se a muita coisa na vida do clube. A revisão estatutária, a era de transparência prometida, uma definição clara da política desportiva, a liderança demonstrada em todos os momentos e não apenas quando há taças para levantar, o veredicto quanto ao treinador da equipa de futebol, o plano para o futuro das modalidades, a estratégia empresarial do clube, os executantes dessa estratégia. Quantas respostas categóricas encontramos na forma como o Benfica é gerido hoje? Podia dar-se o caso de haver um trabalho estupendo operado nos bastidores cuja manifestação externa era clara, acomodava a crítica, reagia à atualidade mesmo que não a liderasse, mas nada disso acontece. Podem os apoiantes da atual direção, ou até os membros da direção, argumentar que um clube não se gere de fora para dentro, mas de que serve andarmos há anos a gabar os milhões que mais ninguém tem, se depois os decibéis da sua voz são olimpicamente ignorados? Apetece por isso perguntar: estamos à espera de quê?
Ser do Benfica e ter uma opinião divergente é um caminho que traz poucas alegrias. Quem coloca questões ou faz críticas adquire imediatamente o estatuto de inimigo do Benfica, abutre oportunista, mestre de cerimónias na derrota. É uma das técnicas favoritas da propaganda, muitas vezes tentada por quem detém o poder e o pretende manter. Tudo isto parte de uma premissa quase enternecedora e frágil como cristal, muito popular nas redes sociais. Diz assim: quem não está no Benfica e decide criticar só o faz porque precisa do clube para a sua afirmação pessoal e profissional. É alguém que prefere o insucesso do clube a qualquer custo, desde que os proveitos sejam para si. Compreende-se a perceção, já que é algo que fez escola no clube. É irónico que a esmagadora maioria dos críticos da atualidade com quem falo sejam pessoas que apenas querem seguir em frente com as suas vidas e não precisam do Benfica para nada a não ser para lhes dar alegrias, mas a propaganda nunca deixa que a realidade estrague uma boa história.
Por outro lado, quem está no Benfica, apesar dos longos anos passados no clube, em alguns casos sem outra experiência profissional relevante ou tempo ocupado em cargos remotamente similares, apesar do percurso errático, apesar da perpetuação dos vícios, apesar do silêncio comprometedor, apesar do aparente medo da crítica, apesar de parecerem mais do mesmo, atenção, estes não precisam do Benfica para nada. Celebremos a sorte divina. Quis a obra e graça do Espírito Santo que o Benfica fosse abençoado pelas virtudes desinteressadas de um coletivo de benfeitores que, após uma longa jornada de sacrifício e abnegação, se entregaram a esta obra caridosa e abdicaram de si mesmos. Não podemos pedir mais a quem já nos deu tudo. Em troca, só nos pedem que guardemos as críticas para nós, cumpramos o manual de instruções dos Benfiquistas de bem, e deixemos estes obreiros de Deus fazer o seu trabalho. Se assim não for, explicará a nota informativa, das duas uma: o Benfica perderá ou vencerá apesar dos Benfiquistas.
Feitas as contas, é capaz de ser uma boa ideia enchermos o pavilhão na próxima Assembleia Geral do clube, deixando desde já um alerta: se tudo correr bem, não haverá tachos suficientes para tantos abutres oportunistas.