Cristiano Ronaldo e as decisões de Roberto Martínez
Roberto Martínez Foto; IMAGO/Picture Point LE
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Cristiano Ronaldo e as decisões de Roberto Martínez

OPINIÃO02.07.202408:17

A primeira impressão, muitas vezes a correta, é que o selecionador fez trocas pelo estatuto

Cristiano Ronaldo desabou. Não foi, obviamente, a primeira vez que vimos o capitão da Seleção Nacional em lágrimas, mas foi a primeira vez que o vimos num estado emocional descontrolado. Ronaldo pertence àquela elite muito restrita dos jogadores que sabe que falhar faz parte do sucesso. Que cair faz parte do processo que eleva desportistas à condição de imortais.

Podemos já não estar a ver um Cristiano de outro planeta, talvez estejamos a ver mais o homem do que o futebolista, mas isso não invalida duas coisas. A primeira é que Ronaldo elevou o futebol português e, consequentemente os seus jogadores, para patamares que mais nenhum futebolista da História conseguiu. Nesta segunda-feira, Ronaldo mereceu a retribuição de 15 anos a carregar a esperança de um país às costas, quando este entrava em campo para jogar futebol. A segunda é que Roberto Martínez não pode ter receio de ter de tomar as decisões futebolisticamente mais lógicas.

A segunda merece, claramente, mais umas quantas observações. Portugal acabou por passar aos quartos de final do Euro-2024 com penáltis apontados por Cristiano Ronaldo, Bruno Fernandes e Bernardo Silva. Pondo as coisas de modo simples, as três principais estrelas maiores da Seleção Nacional. Porém, deu muitas vezes a sensação de que, cada um deles, em determinada altura do jogo, ou a partir de um certo momento todos, talvez não fizessem sentido estar em campo.

A primeira impressão, e muitas vezes essa é a correta, é que o selecionador fez trocas pelo estatuto. Pelo estatuto que Vitinha não tem, por exemplo, apesar de ter mais lógica estar em campo do que, provavelmente, outros elementos.

Não está em causa o valor individual de nenhum jogador, felizmente, há talento suficiente nos 26 escolhidos, está, isso sim, o rendimento dentro de um jogo.

Imagino que Portugal tenha dados físicos estatísticos dos jogadores, como sucede nas melhores equipas do mundo — e a federação portuguesa fará, certamente, parte desse lote — e estranharia se não mostrassem quebras em determinados futebolistas. Mas vamos imaginar que não, que mesmo fisicamente o rendimento não cai aos 70 minutos: há coisas que estão à vista de todos, como o que Portugal ganha com Vitinha em campo — tão notório foi o que perdeu sem ele! Com as trocas, Martínez conseguiu retirar o flanco esquerdo a Portugal — Conceição nunca conseguiu romper como Leão e sente-se claramente mais confortável à direita; e depois ainda se conseguiu apagar a chama de Cancelo, que saiu depois, aí sim, exausto.

No fundo, precisamos de um Roberto Martínez mais treinador e menos gestor de balneário, até porque vem lá a França que, por norma, não tem piedade pelos indecisos, nem se atemoriza quando pela frente possa ter algum monstro. Seja este o peso histórico de Ronaldo, ou as mãos de Diogo Costa, que nesta segunda à noite foram as mãos de todo o Portugal.

Artigo publicado no jornal impresso.