Benfica não reagiu

OPINIÃO06:00

'Visão de golo' é o espaço de opinião semanal de Rui Águas, treinador e antigo internacional

Quando se perde e se representa um grande clube, é vulgar dizer-se que a reação se impõe logo depois. Não foi este o caso na Luz. A questão é que se os erros se repetem, é natural que o (mau) resultado possa ser o mesmo. O início do jogo do Benfica com o SC Braga voltou a ser de pronunciado desacerto e desinspiração.

A escolha de Bruno Lage para o onze, no rescaldo de Alvalade, recaiu sobre Leandro Barreiro, justamente premiado pela influência que representou então na melhoria do Benfica. Por outro lado, Amdouni, mesmo empenhado, não fez a diferença no jogo anterior, perdendo a preferência de Lage para Pavlidis, um avançado mais tradicional para quem tem que atacar em continuidade, como era suposto.

Tudo certo. Afinal, o avançado grego protagonizou, cedo no jogo, o lance mais claro que o Benfica criou em toda a partida, sem a pontaria necessária. Quem diria que essa seria a mais clara oportunidade criada pelo Benfica no tempo inteiro. Tendo em conta a qualidade dos jogadores do Benfica, a sucessão de passes falhados, muitos deles aparentemente simples, acabou por deixar marcas. A equipa perdeu continuidade e ligação entre setores e a confiança foi abalando, ainda no rescaldo mental de Alvalade.

Por outro lado, essas contínuas perdas de bola foram dando munições ao adversário, perito no ataque rápido e com Bruma em grande nível. Numa dessas saídas o SC Braga marca e adensa as dificuldades, beneficiando duplamente da apatia defensiva caseira.

Quando o ataque enfrenta dificuldades de progressão e finalização, a defesa ainda deve reforçar a guarda. O setor mais recuado depende muito mais da concentração e coordenação do que de qualquer talento ou técnica especial. Quando o momento é difícil e as coisas não saem, a estrutura lá atrás deve amparar o momento, garantindo a segurança defensiva da equipa. Foi o contrário.

Depois, e embora reagindo na segunda parte, de positivo, pouco mais do que o belo golo de Arthur Cabral que o faz reentrar seriamente na luta pelo onze. Agora é tempo de múltiplas teorias, já se sabe... Algum dos nossos sábios me explica o ciclo negativo do Manchester City?

ALVOROÇO GERAL

Dificilmente uma época futebolística decorre sem alterações exibicionais e só sorrisos, tal a complexa diversidade de fatores que acompanham a vida de uma equipa de futebol. Os três clubes que dominam o futebol português já viveram na primeira volta deste campeonato pronunciadas variações.

No futebol, já se sabe, os resultados provocam oscilações e as oscilações causam a agitação que regularmente observamos. A imprensa e os adeptos são também, como sabemos, atores que fazem parte e enfeitam este complexo fenómeno de instabilidade frequente (tipo Choupana).

Vejamos o primeiro cenário de 2024: o Sporting desceu do céu ao inferno, com a mudança de técnico. Já o FC Porto, fruto das alterações profundas que conseguiu (o uso do verbo conseguir é intencional...), atravessa uma fase de reorganização complicada, ante vários condicionalismos. O Benfica, por sua vez, recuperou da fase Schmidt de uma maneira tão retumbante que nem os mais otimistas esperariam.

Bem diferente é já o cenário do final de 2024: o Sporting, entretanto, fez render a vitória no dérbi e o FC Porto e os seus novos líderes conseguem agora respirar, depois de melhores resultados.

Voltando ao Benfica, a fase que atravessa sucede a outra em que tudo parecia fácil e ultrapassável, mesmo com pouco tempo de treino. O entusiasmo, a motivação e a dinâmica goleadora terão camuflado as dificuldades naturais que uma mudança técnica acaba por trazer.

Depois de um mau final de primeira volta, a consolidação de processos é um objetivo urgente e diário, mesmo com o tempo sempre contado pela densidade competitiva atual. O Benfica tenta agora recuperar de uma pré-época que não teve, mas numa fase adiantada e em diferente contexto de liderança técnica.

Com tudo isto, a história só vai a meio. A calma e apoio dos adeptos, a organização e o controlo emocional farão a diferença.

APOIO PRECIOSO

O assobio é manifestação bem portuguesa. Mesmo legítimo é aliado do adversário. As equipas e os jogadores, quando em dificuldade, não precisam desse som irritante e incómodo. Mesmo num estádio cheio, uma dúzia de adeptos que sejam conseguem, infelizmente, fazer-se ouvir e acumular a tensão do momento. Raro é o jogador que não se deixa afetar e um mal-estar multiplicado por onze é igual a toda uma equipa diminuída.

Lembro sempre Nené, talvez o jogador mais assobiado da história do clube, um goleador impenetrável difícil de imitar. Uma exceção que mais valia ser regra.