A senhora da gadanha
Vitinha saiu e regressou mais forte: Francisco Conceição saiu e regressou mais forte. Jesus saiu e regressará, talvez mais forte.
Ia começar este texto falando da senhora da gadanha e dos tantos conhecidos do desporto português que ela tem recebido nos últimos dois meses e meio, mas, como o meu camarada JMD já nela fala pormenorizadamente no seu texto de opinião, decidi escrever, então, sobre o inverso: não a morte, a vida; não o fim, o princípio; não a decadência, o esplendor. Que se lixe, pois, a senhora da gadanha, de cujos mãos ninguém escapa, nem mesmo aqueles que se julgam eternos por via de obras valerosas, como escreveu o bom do Luís Vaz.
Vida, princípio e esplendor, portanto. Quando penso nestas três palavras, penso em três homens. Três quase meninos: Diogo Ribeiro, João Neves e Francisco Conceição. O nadador do Benfica tem tudo para ser grande: sofreu e recuperou; caiu e levantou-se; começou por conhecer o negro e agora sabe o que é o azul celeste. Tem tudo para ser ainda maior do que já é. O médio do Benfica é um caso singular no futebol português: quase todos gostam dele. Tem ar de menino bem comportado, mas dentro de campo é uma fera. Tem vida, tem princípios e terá cada vez mais esplendor. Podia ser para alguns o abominável homem das neves, mas tornou-se, por mérito próprio, o adorável homem das neves. O avançado do FC Porto é ligeiramente diferente. Tem chispa herdada do pai e tem ainda mais talento do que o pai. Escrevi duas vezes a palavra pai e cometi duplo erro: o Francisco já se emancipou do apelido. Começou por parecer um brinca-na-areia, um daqueles meninos que, há umas décadas, entravam em campo ao intervalo para divertir os espectadores. Porém, tal como Vitinha para o Wolverhampton, saiu para o Ajax e voltou ao FCP. E regressou maior. Era conhecido como o filho do Sérgio e qualquer dia o Sérgio passará a ser conhecido como o pai do Francisco.
Voltemos a inverter a lógica do texto e deixemos de lado a senhora da gadanha e os quase meninos e falemos de alguém que, por muito que possa ser criticável pela farronca e por frases mal construídas, construiu, a pulso, excelente carreira de treinador: Jorge Jesus. Não é fácil estar a pouco mais de quatro meses de completar 70 anos e continuar com a mesma energia de quando tinha 50 ou 60. E com a mesma febre de ganhar de quando tinha 40 ou 50. E com a mesma autoconfiança de quanto tinha 30 ou 40. JJ é quase uma cópia de CR. Pode estar com 159 anos e quer ganhar. Pode estar na Liga do Butão e acha que esta tem o mesmo nível da Liga portuguesa. Pode ser aquilo que acharmos que é, mas algo é inatacável: está a 90 minutos de entrar na história do futebol mundial, caso ganhe o 28.º jogo seguido pelo Al Hilal. É na Arábia Saudita? Sim, é. Mas quantos treinadores conseguiram na Arábia ganhar 27 vezes de enfiada? Bola.
Por fim, um PS. Ou antes: um CPS, como era conhecido o nosso Carlos Pereira Santos, levado há exatamente uma semana pela senhora da gadanha. O CPS foi um jornalista de corpo inteiro: cabeça, tronco e membros. Nunca quis ser um jornalista com a mania que é treinador. Porque, como diria Manuel Sérgio, um jornalista com a mania que é treinador, nem jornalista é. Forte abraço, CPS!