A semana em revisão
O desporto (o mundo) tem gente demasiadamente doente para partilhar do mesmo oxigénio que todos nós
A final do Campeonato de Portugal entre V. Setúbal e Amarante foi dirigida por uma equipa de arbitragem totalmente feminina: à árbitra principal Sara Diana Alves (AF Viana do Castelo) juntaram-se as assistentes Andreia Sousa e Cátia Tavares. A quarto árbitro foi Sara Moreira Alves.
O feito, inédito, aconteceu em 2024 mas poderia ter acontecido mais cedo. Há muito que Portugal tem várias árbitras com qualidade e experiência suficientes para atuarem em jogos/competições desta exigência e mediatismo. A nomeação para o Jamor foi um prémio merecido para o quarteto e para todas as mulheres que em boa hora tiveram a coragem de abraçar uma carreira difícil, historicamente associada ao género masculino. Felizmente, o tempo tem sabido desmontar esses e outros preconceitos e hoje o que se exige em alta competição são agentes desportivos (homens ou mulheres) competentes, capazes de estar à altura dos desafios que têm em mãos. Parabéns à equipa de arbitragem e ao Conselho de Arbitragem pela escolha corajosa.
Aos 54 anos de idade, Fernando Rocha (AB Porto), um dos nomes grandes do basquetebol português, encerrou a sua longa carreira como árbitro. Depois de uma experiência enquanto atleta nos escalões de formação (na modalidade e também no futebol), o ex-internacional portuense esteve 38 épocas consecutivas na arbitragem da modalidade, realizando um total de 981 (!) jogos oficiais. Só para que se perceba o nível galáctico que Fernando Rocha atingiu: foi árbitro internacional de 1995 até 2019 (24 épocas seguidas), arbitrou jogos das principais ligas europeias (Eurocup e Euroliga), tendo nesta última marcado presença em várias Final Four. Foi nomeado para dirigir jogos nas finais da EuroBasket e Eurocup, além de ter sido árbitro da VTB League. Garantiu presença num Campeonato do Mundo, sendo então o primeiro árbitro português a consegui-lo. Mais tarde participou noutro, como árbitro neutro, de masculinos de sub-19. Pelo meios muitas outras partidas além-fronteiras. No passado mês de maio esteve noutra Final Four, no caso em Berlim. Despediu-se no passado dia 10 num sempre acalorado Benfica-FC Porto, onde saiu cumprimentado por todos os agentes desportivos.
Uma carreira assim merece o respeito não apenas do mundo do basquetebol, mas também do universo desportivo e, em boa verdade, de todos nós. O Fernando é um exemplo para todos e a prova viva que maturidade e experiência são quase sempre os melhores aliados da competência. Chapeau.
Aconteceu de novo e desta vez com a expressão máxima que o tribalismo pode ter: num dos jogos dos quartos de final da Taça do Congo (entre FC Tanganyka e OC Renaissance de Kinshasa), o árbitro da partida foi violentamente agredido por alguns adeptos da equipa forasteira, ainda que procurando fugir para junto de proteção policial. A selvajaria foi de tal forma que há notícias locais que apontam para a morte confirmada do juiz congolês (inicialmente foi dito que estaria nos Cuidados Intensivos a lutar pela vida). Uma das imagens mais fortes desta barbaridade foi gravada junto aos balneários das duas equipas: o árbitro caído no chão, totalmente inconsciente e mesmo ao seu lado, a cerca de metro, metro e meio, vários jogadores da equipa da casa a festejarem, aos saltos e gritos, a passagem à eliminatória seguinte. O desdém, a indiferença são difíceis de esquecer. Confesso que são raros os momentos em que tenho dificuldade em expressar o que me vai na alma. Este é um deles. O desporto (o mundo) tem gente demasiadamente doente para partilhar do mesmo oxigénio que todos nós, pessoas de bem. Uma vergonha inqualificável que tem que levar à intervenção urgente da FIFA. Prisão para todos os responsáveis banimento para quem for desportivamente culpado. Ontem já era tarde.
Dois jogos particulares de Portugal até à data, duas arbitragens com estilo e abordagens totalmente distintas: a primeira algo permissiva, deixando vários cartões por exibir por entradas negligentes; a segunda excessivamente rigorosa, mostrando cartões em situações que não o justificavam. Como em tudo na vida, o difícil é agir da forma mais fácil: equilibrada e com moderação.