A Seleção sem Ronaldo
QUE me desculpem, mas não embarco nessa moda de dizer que a Seleção Nacional é, afinal de contas, melhor sem Cristiano Ronaldo. Sustentam os criadores (e na sequência os seus defensores) desta nova tendência a sua afirmação em dois factos: 1 - os resultados positivos de Portugal na Liga das Nações; 2 - o facto de a equipa jogar melhor agora que todos os outros jogadores se viram livres da obrigação (é mesmo assim que lhe chamam) de ter de jogar para o capitão. Mesmo entendendo a ideia, penso que os dois argumentos são falaciosos. Por duas razões: 1 - até parece que a Seleção perdia mais vezes do que ganhava com Cristiano Ronaldo. Não é verdade. É, até, de uma imensa ingratidão para um jogador a quem devemos muito do sucesso das últimas décadas. Sim, é verdade que antes de CR7 já Portugal era presença assídua nas fases finais das grandes competições internacionais, mas não nos podemos esquecer de quão decisivo foi o capitão no apuramento para algumas das mais recentes - em play-off ou, simplesmente, na fase de qualificação, em muitas das quais foi o melhor marcador. Não devemos ter memória curta... 2 - dizer que os outros jogadores são obrigados a passar a bola a Ronaldo (tese que muito jeito dá a quem quer provar, a todo o custo, ser Cristiano o dono da Seleção...) é, no mínimo, forçado. Por exemplo: se eu tiver hora e meia para resolver um problema e ao meu lado estiver alguém que, por alguma razão, sei conseguir solucioná-lo melhor e mais depressa, é natural que lhe passe a bola. Por outras palavras: se Ronaldo bate livres, penáltis e faz golos com mais facilidade do que qualquer outro - penso que é, essencialmente, a esses momentos que se referem -, é natural que os outros o procurem antes de qualquer outro. Não é obrigação. É, apenas, humano.
Em suma, nenhuma equipa pode ficar mais forte se deixar de contar com um jogador como Cristiano Ronaldo. E quem pensar o contrário não demorará muito a perceber o erro: veja-se o Real Madrid - se bem que Florentino Pérez, do alto da sua arrogância, lhe juntou outro erro: contratar um treinador incapaz de perceber que o resultado de um jogo está no item que diz golos e não no que diz posse de bola. Lopetegui, aposto, não deixará saudades no Real, da mesma forma que não deixou saudades em Portugal. A não ser, talvez, nos adversários do FC Porto...
OUTRA coisa, bem diferente, é dizer que a ausência de Cristiano Ronaldo não tem, necessariamente, de ser encarada como um drama. Se alguma coisa de bom esta ausência do capitão trouxe foi a esperança de que pode, afinal, haver vida depois dele - algo que há uns anos não seria assim tão evidente. Os jogos com Itália e Polónia provaram que esta nova geração (Rúben Dias, João Cancelo, Mário Rui, Rúben Neves, Bernardo Silva, André Silva e muitos outros) pode, talvez de forma diferente mas nem por isso menos eficaz, manter-nos entre as principais seleções mundiais. Se Portugal joga, nesta nova versão, um futebol mais atraente é discutível, mas não restam dúvidas de que os sinais são, nesta altura, francamente positivos.
Falando claro: se há uns anos diríamos que com Cristiano Ronaldo podíamos ganhar a qualquer seleção e sem ele nos arriscávamos a não ganhar a nenhuma, agora podemos dizer que mesmo sem Ronaldo somos capazes de enfrentar qualquer adversário. É, não nos enganemos, um upgrade importante, até porque o capitão tem 33 anos e não será eterno. E talvez a melhor coisa que disto se tirará quando CR7 voltar, em 2019, às escolhas de Fernando Santos é os que com eles jogam terem, enfim, percebido que também eles são capazes de resolver. Fernando Santos agradece. E até Cristiano Ronaldo se sentirá, decerto, mais leve. Por muito que muitos não o consigam admitir.