A Luz Vermelha da Corrupção

Direito ao golo é o espaço de opinião quinzenal de João Caiado Guerreiro, advogado

O Benfica, Luís Filipe Vieira e Paulo Gonçalves são acusados pelo Ministério Público no caso dos e-mails. Derivado desse facto, é pedida a suspensão do Benfica das competições desportivas por um período máximo de três anos. O suficiente para acabar com o clube e revoltar os seus sócios e adeptos!

Mas pode? Pode. Vejamos: o Benfica é uma pessoa coletiva, por definição não pratica crimes. Quem os pode praticar são as pessoas. A lei tem disso, consciência. O art.º 11º do Código Penal refere que «salvo os casos especialmente previstos na lei, só as pessoas singulares são suscetíveis de responsabilidade criminal». E lista as condições e até os crimes que podem ser praticados por pessoas coletivas. Uma sociedade não pode matar, mas pode cometer o crime de corrupção ativa — art.º 374 do Código Penal. E pode também ser acusada de fraude fiscal qualificada — art. 104 do Regime das Infrações Tributárias.

O Benfica é assim acusado de «por si, por interposta pessoa ou com o seu consentimento (...) der ou prometer a funcionários vantagem (...) que não seja devida» para «qualquer ato ou omissão contrário aos deveres do seu cargo» — art.º 372º do C. Penal. Ou seja, na visão do Ministério Público o dinheiro que terá sido retirado do Benfica, pagando 4.25 milhões de euros pelos jogadores Hermes e Daniel dos Anjos, terá servido para o clube obter determinadas vantagens. Esta questão é absolutamente decisiva.

Mesmo que o tribunal venha a dar por provado que as comissões não eram devidas e foram retiradas do Benfica, isso não chegará. Se foi tirado dinheiro ao Benfica, este, os sócios e os acionistas, são vítimas. E têm até direito a ser ressarcidos por quem tenha perpetrado o crime. Para o Benfica ser condenado é crítico que se prove que beneficiou de alguma maneira.

E já que falamos de prova, Rui Costa, embora estivesse já na administração do Benfica, não foi acusado e o Ministério Público até pretende que seja testemunha contra o Benfica. Pode? Pode, mas a questão é complicada: Rui Costa é presidente do Benfica clube e da SAD. Ou seja, Rui Costa é o máximo representante do clube e tem como obrigação legal defender seus interesses e tudo o que disser será usado contra a instituição que preside. Pior, para além das questões legais, há as questões políticas: a enorme pressão dos adeptos para que o clube seja protegido.

Mas os Juízes e o Ministério Público sabem disso e o que Rui Costa disser a favor do clube será esquecido, mas o que disser contra ficará escrito. Para ele e para o Benfica, o melhor será evitar testemunhar alegando um impedimento ou conflito de interesses e esperar que esses argumentos sejam aceites. Afinal, a pressão pode realmente impedi-lo de dizer a verdade, cometendo perjúrio. E por isso mesmo a lei dá-lhe a possibilidade de recusar testemunhar (art.º 134, 1 c) do Código de Processo Penal.

O Direito ao Golo desta semana vai para os adeptos. Aqueles, penso que a maioria em Portugal, que gostam de ver as suas equipas ganhar por mérito. E sim, há sempre a presunção de inocência, mas da (má) fama ninguém se livra.

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