OPINIÃO A importância do veredito
«O poder da palavra», por Duarte Gomes
Mas afinal de contas, aquilo foi ou não foi penálti? E aquela entrada... o VAR não tinha que chamar o árbitro? O golo foi bem ou mal anulado? No futebol, o povo gosta de verdades absolutas. Precisa de saber o que está certo ou errado, o que foi bem ou mal decidido. E o pobre do jogo, que é fantástico por ser tão inesperado e emocionante, é jogado, treinado e arbitrado por pessoas. Pessoas que andam ali pelo meio a fazer coisas diferentes, que não se repetem: uns saltam, outros correm, uns dão pancada, outros caem e levantam-se...
A verdade é que nem sempre é possível catalogar lances. Nem sempre é possível dizer é assim ou assado. Vem a reflexão a propósito de dois lances do jogo de ontem em Alvalade (resultaram em golos do Sporting), mas podia vir a propósito de muitos outros que acontecem.
Se a infração for evidente, se as imagens forem esclarecedoras, se o lance for claro e óbvio, só os mais irracionais poderão discordar ou continuar em negação. Mas se tudo fosse assim no futebol (aliás, no desporto), tão evidente e cristalino, não seriam necessários árbitros.
Em Alvalade, Esgaio deu um sai daqui a Murilo depois do adversário cruzar o seu caminho de braços abertos. A dúvida foi ali a que é quase sempre: Será que o contacto foi suficiente para ser considerado como faltoso? Será que o agarrão foi ostensivo e exigia punição? Ou o toque foi na sequência de obstrução mal preparada? Ou o jogador, assim que sentiu a mão no braço, parou e protestou, porque perdeu o lance?
Acreditem, são demasiadas dúvidas para quem tem o apito na boca e até para quem, em sala, vê aquelas imagens e fica com a tal sensação de não saber bem o que pensar. Isto acontece mesmo e não há mal nenhum. O que tem que haver depois é uma resposta coerente e afirmativa, que vá ao encontro daquilo que o futebol espera. O que não pode acontecer depois é, em lances idênticos, haver opções distintas.
Ontem, Cláudio Pereira foi coerente na amplitude técnica que deu às suas análises, ainda que numa delas contrariando a opinião do VAR: é verdade que Gyokeres colocou as duas mãos nas costas de Zé Carlos, como é verdade que o defesa caiu de imediato. Mas apesar da alegada causa/efeito, nenhuma imagem conseguiu medir que carga foi colocada naquele contacto e se essa foi suficiente para ter tal desfecho. Quem nos garante que o defesa não escorregou (como parece ter acontecido) e caído por isso e não por ter sido derrubado pelas mãos do sueco? Quem nos assegura que a queda só aconteceu para levar o árbitro a assinalar infração do atacante? Nada. Nem para um lado, nem para outro. E aí voltamos ao essencial: decide quem está bem colocado, quem tem a autoridade e quem sabe o critério que utilizou no jogo. Tem é que o fazer com consistência e uniformidade. A decisão final pode ser errada? Pode. Mas a conversa seria a mesma se a opção técnica fosse oposta.
Moral da história: nos lances de nim, os tais subjetivos, cinzentos ou de interpretação, aqueles que as imagens pouco ou nada esclarecem, tenhamos o bom senso de aceitar como boa a decisão de quem está lá dentro. São esses que têm legitimidade para decidir. Deixemos a crítica feroz para aqueles momentos em que o erro é abissal, em que a má decisão quase nos faz corar de vergonha (e sim, infelizmente acontece).
Em todos os outros, não contribuamos para incendiar um ambiente já de si inflamável, censurando opções que não foram diferentes daquelas que, há um ou dois jogos, até nos podem ter beneficiado.