Espaço Universidade O sonho das navegadoras com Portugal no coração (artigo de José Neto, 154)
Estão criadas todas as condições para ilustrar na história do Futebol em Portugal, mais uma página capaz de cultivar na memória dos tempos a força da sua grandeza com a presença da seleção nacional feminina num campeonato do mundo.
Dizia antes do jogo da estreia, que não me surpreenderia com a obtenção dum resultado positivo, já que estaria certo duma entrega absoluta para um rendimento desejado… e neste âmbito a derrota por 1 – 0, perante uma seleção (Países Baixos), Campeã Europeia em 2017 e Vice - Campeã do Mundo 2019, e da forma como discutiram o jogo, em especial na 2ª parte, apeteceu-me logo enviar os parabéns, o que fiz de imediato.
Existe um código de valores subjacente na linhagem desta seleção das nossas navegadoras, reunindo num assumido compromisso de desempenho na cumplicidade que lhes sobra, e na forma como se entregam á tarefa.
Esta alegria transbordante perante a conquista de objetivos difíceis e encorajadores, transformando a forma de encarar os treinos e os jogos sempre com o olhar cravado na esperança, convertida pela sua exigência participativa!... Então hoje naqueles olhares sorridentes e húmidos, arrasados pelo cântico do nosso hino nacional, ficou mais uma vez comprovado o que acabei de referir.
Creio mesmo que este clima notório, povoado dum sublime estado de consciência, ancorado duma felicidade coletiva, indutor de relações duma fiabilidade estável, justificado pelo entusiasmo, confiança, otimismo e felicidade, pode provocar no seu seio o encontro do êxito que se pretende assumir, no sucesso que se deseja conseguir.
Depois o apelo para a alta qualificação com que a estrutura federativa soube interpretar, para a participação nesta exigente competição, nomeadamente realizada em absoluta rotação horária de cerca de 12 horas de diferença, obrigando a uma adaptação dos ciclos circadianos, que a travessia dos diversos fusos horários (jet lag) fazia implicar. Já o referi em artigos anteriormente publicados, e no que respeita à adaptação do organismo dos atletas, a existência duma dissuasão dos ritmos diários das funções psicofisiológicas correspondentes a 1 dia por cada fuso, definindo vários autores como regra a hora de dormir e acordar apenas normaliza de 1 a 5 dias, vendo enquadrada a atividade intelectual e psicomotora entre 7 e 10 dias, para uma excelente capacidade de resposta, nomeadamente ao nível da resistência.
Ao não tomar em consideração este e outros aspetos, fica comprometido a resposta às exigências da competição, pela dessincronização dos ritmos biológicos, múltiplas manifestações de fadiga, maior dificuldade de concentração, maior irritabilidade ao desgaste, maior perceção de ameaça, diminuição do estado de alerta, alteração dos ritmos cardíacos, etc. …
Ora como sabemos, tudo foi devidamente legitimado pela competência da estrutura técnica da seleção, abonada de forma absolutamente transparente pela superior estrutura federativa. Aliás, como bem conhecemos, a visão estratégica e modelar do presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Dr. Fernando Gomes, não é novidade, e que em tudo e neste âmbito do Futebol Feminino possibilitou o enquadramento na sua fórmula de atuar, com uma dimensão absolutamente notável, porque GANHADORA.
Depois a capacidade de liderança do selecionador Francisco Neto, que ao longo do tempo foi criando um padrão de exigência apoiado numa dinâmica reconciliadora, formulando a conquista de objetivos difíceis e encorajadores, transpirando rigor, otimismo, paixão, consciência e razão. Nas suas mensagens evidencia-se uma imagem de seriedade, competência e responsabilidade, descodificando os fracassos, transformando-os em êxitos, transmitindo os valores da honestidade, firmeza de convicções, respeito e exigência duma responsabilidade partilhada.
Apenas mais uma nota de circunstância que muito me apraz registar: em 1991/92, a convite do então Diretor do recém criado Instituto Superior da Maia, Professor Doutor Domingos Silva, depois Reitor do Instituto Universitário da Maia e atualmente presidente do conselho de gestão da Maiêutica, sendo atualmente o distinto Professor Doutor José Ferreira Gomes, Magnífico Reitor da nossa ainda jovem titulada Universidade da Maia, tive o privilégio da docência da disciplina de Futebol do 1º ano e sequente componente da opção do 4º ano (pré Bolonha).
No início com 2 turmas de Futebol Feminino, (agora inseridas em turmas mistas), logo verifiquei uma total disponibilidade para a prática duma modalidade que na época era praticamente contraproducente, ou desaconselhada, desditosa e até objeto de alguma discriminação social.
Curioso que algumas alunas até me pediam para usar 2 pares de caneleiras, bem ajustadas nas pernas até ao joelho, com receio de ficarem com umas “medalhas” resultantes de prováveis ou inesperadas caneladas na disputa da bola!...
Logo verifiquei uma doação objetivada por sinais de muita alegria, entusiasmo, motivação e uma imprescindível capacidade de entrega ao esforço exigido. Uma parte do que refiro está publicado num artigo em 2 páginas, numa revista que na época era deveras conhecida “GOLO”, da autoria do jornalista José Carlos Sousa e que ao reler, passo os meus olhos, ficando com o coração a sangrar de saudade!...
Saúdo vivamente a seleção feminina de todos nós e lhes formulo o desejo para que sejam capazes de honrar este nosso legado, convertido no sentimento lusitano, e como refere Fernando Pessoa: “que consigam conquistar a distância, por mar ou outra, mas que seja sempre nossa”.
VIVA PORTUGAL
José Neto: Metodólogo de Treino Desportivo; Mestre em Psicologia Desportiva; Doutorado em Ciências do Desporto; Docente universitário – universidade da Maia; Formador de Treinadores F.P.F./U.E.F.A.; Embaixador nacional para a Ética e Fair Play do Desporto.