ENTREVISTA A BOLA «Saí do FC Porto para a 2.ª divisão e perguntaram-me se eu estava bem»

ANDEBOL10.09.202410:00

Ricardo Costa lembra o percurso suis gerneris como treinador e garante: «Tenho muito orgulho»

Ricardo Costa viveu dois anos anormais enquanto treinador do FC Porto: venceu todos os jogos da fase regular em duas épocas seguidas... mas acabou sem o título nacional. Depois dessa experiência, a opção do técnico foi radical: assumir o comando do FC Gaia, na 2.ª divisão. No primeiro ano, levou o clube à final four da Taça de Portugal, no segundo subiu de divisão e no seguinte ficou em 7.º já entre a elite. Seguiu-se um ano no Avanca, antes de dar o salto para o Sporting.

Quando foi apresentado no FC Porto, em 2015, o clube vinha de um período de grande domínio, e o Ricardo na apresentação disse ter a certeza de que seriam campeões. Se chegasse hoje ao Sporting, teria a mesma confiança?

Completamente! Podemos falar de há nove anos: tivemos dois anos a ganhar os jogos todos da fase regular, tal como fizemos agora com o Sporting. Eu sei que as pessoas podem não valorizar isso, mas eu valorizo. Eu já era competitivo como atleta, queria estar até à última para poder ganhar! Por isso, posso pôr-me em bicos de pés para dizer que as minhas equipas são competitivas, ganhando ou perdendo.

Chegou a temer que acontecesse o mesmo este ano?

Naquela altura, o formato competitivo era diferente, havia play-off. Na época passada, nós partimos nove pontos à frente [os pontos eram divididos ao meio para a 2.ª fase], perdemos um jogo - que é normal ir perder ao Dragão – e esses nove pontos foram à vida. Podíamos ter perdido. Porque se nós temos dois ou três atletas importantes que não estão… e se calhar dizia-se que o Ricardo Costa é um pé frio! Mas já seria mau treinador? Eu acho que não. A análise que faço do meu trabalho é muito mais do que apenas e só de meter a medalha ao peito. E hoje sou muito melhor treinador, como um jornalista com 20 anos de experiência, é muito melhor do que quando começou. Mas não tenho vergonha do meu passado. Tenho orgulho enorme, sabendo que hoje sou melhor do que era há dez anos.

Após a conquista do título, partilhou que teve um momento, ali com o troféu à sua frente, em que ficou a pensar no seu trajeto. Após sair do FC Porto foi treinar o FC Gaia, na 2.ª divisão e demorou quatro anos até regressar a um grande. Quão importante foi isso na sua carreira?

[sorri] Quando decidi ir por esse caminho, a minha família perguntou-me se eu estava bem. E eu tive momentos de reflexão para pensar no que queria para a minha carreira. Eu acreditava e acredito sempre em mim e na minha capacidade enquanto treinador e digo muitas vezes aos atletas que, por vezes, temos de dar dois passos atrás para dar um à frente. Eu era consciente de que precisava de provar às pessoas que era capaz. Não pondo em causa a minha capacidade ou aquilo que eu pensava sobre mim. E não tive problema nenhum em assumir: vou para a 2.ª divisão, vou construir aqui uma equipa, rodear-me de atletas que conheço daqui que são umas mais valias.

Ricardo Costa com o troféu de campeão nacional de andebol, conquistado ao serviço do Sporting

Trabalhou com equipas muito muito jovens.

Sim. Eu disse ao [Pedro] Rêma [então dirigente do clube e pai de Diogo Rêma] «vou conseguir subir esta equipa e vamos lutar por estar lá em cima». No primeiro ano fomos à final four da Taça, perdemos por quatro contra o Benfica. No ano seguinte conseguimos subir e foram uns anos que me deram um gozo enorme. Tive a possibilidade de começar a trabalhar com os meus filhos e de me dedicar todos os dias. Há coisas que nos acontecem na vida e que não percebemos o porquê de nos estarem a acontecer. Mas acredito muito em mim e na força do trabalho. E, acima de tudo, tenho orgulho no meu trajeto.

E era nisso que pensava logo após sagrar-se campeão?

Sim. Naquele momento, quando fui campeão pelo Sporting, foi um momento de introspeção e de pensar que valeu a pena. Valeu a pena dar os dois passos atrás. E não vou mentir: muitas vezes pensava: eu gostava de ter uma oportunidade num grande. E por isso tenho de agradecer ao Carlos Carneiro, que se lembrou de mim, e de dois miúdos que podiam vir a ser [grandes jogadores], mas ainda não eram. Acho que o mérito é dele, porque foi ele que acreditou e propôs ao presidente Frederico Varandas. Disse que tinha uma direção para o andebol Sporting e acho que saímos todos a ganhar.