23 abril 2024, 09:00
Rosa Mota gritou liberdade na pista
Atleta do FC Foz alcançou em julho de 1974 o recorde nos 3000 metros dos Nacionais de Atletismo
Tradicionalmente separadas dos rapazes, incontáveis foram as raparigas que não seguiram a veia desportiva por questões sociais, estruturais ou culturais, durante o regime salazarista. Mas alguns dos destes problemas marcantes dessa época continuam presentes na atualidade
António Gomes Ferreira refere no seu texto - “O ensino da Educação Física em Portugal durante o Estado Novo” - que só era permitido às crianças de todas as idades praticarem desporto em conjunto até aos 10 anos, altura em que era desincentivado às raparigas continuarem por esse caminho, devido a uma «prevalência moral conservadora».
Hoje, é impossível avaliar as consequências que essa atitude teve no desenvolvimento do desporto feminino, mas tal nem é a questão mais relevante para o Presidente da Sociedade Portuguesa de Educação Física, Nuno Ferro: «Isto teve mais impacto na perspetiva cultural. Elas podiam praticar desporto, mas muitas coisas eram mal vistas. Havia vários preceitos morais que faziam com que o papel da mulher não fosse encarado da maneira que é nos nossos dias.»
As mulheres que ainda seguiam o sonho desportivo eram rotuladas de «marias rapazes», como indica Luís Bom, professor e investigador universitário, uma vez que as barreiras que enfrentavam não eram fruto do acaso: «Era a missão de inibição, de contrariar a plena expressão da prática desportiva das raparigas que não correspondiam ao estereótipo de mulher caseira.»
23 abril 2024, 09:00
Atleta do FC Foz alcançou em julho de 1974 o recorde nos 3000 metros dos Nacionais de Atletismo
Nuno Fialho, vice-presidente do Conselho Nacional das Associações de Professores de Educação Física, salienta ainda que este aspeto não concerne só o desporto e que é «um bom exemplo de como o papel da mulher na sociedade ainda não é valorizado».
De facto, as jovens mulheres desistem do desporto mais cedo e com maior frequência do que os homens, como indicam tanto Ferro como Fialho. «Há uma dimensão cultural que não está resolvida entre todos. As mulheres abandonam o desporto muito mais precocemente e isso faz com que não tenham uma continuidade desportiva», indica o primeiro, ao que o segundo acrescenta: «Na entrada do secundário é onde há maior queda nos exercícios dos jovens, que é ainda maior nas raparigas. É necessário mudar essa mentalidade.»
No entanto, os três entrevistados por A BOLA não têm dúvidas, já que todos concordam que a diferença da realidade atual para a do Estado Novo, neste aspeto, é enorme. Não existem entraves estruturais às desportistas… mas sociais sim.
24 abril 2024, 09:13
Durante os 41 anos em que vigorou o Estado Novo, as conceções de desporto e de atividade física pouco foram fomentadas. Tal teve um impacto direto no desenvolvimento do desporto no país, que ainda hoje se sente
«Ainda hoje há alguns impedimentos nalguns meios, uma mulher desportista não é das coisas mais reconhecidas. Há um certo clima que marca alguns estratos sociais», explica Nuno Ferro.
Claro que, com o desporto feminino a merecer pouca ou nenhuma atenção durante o Estado Novo, várias modalidades neste género só se começaram a desenvolver nos últimos 50 anos – e com algum grau de sucesso, mas ainda é necessária uma aposta maior no desporto feminino.
«Apesar de o futebol e o futsal terem números interessantes, é preciso incentivos extra para haver maior adesão e permanência nessas e noutras modalidades», afirma Fialho, ao que Ferro completa: «Ainda há um caminho a fazer.»