Francisco Santos explicou a A BOLA porque se retirou depois de ainda ter começado a época no Sporting. Revelou que ter estado nos Jogos de Tóquio-2020 lhe deixou um vazio e ter partido os dois pés não ajudou para chegar a Paris-2024.
Depois de 15 anos na natação, no passado domingo o olímpico do Sporting Francisco Santos anunciou, aos 26 anos, o adeus definitivo às piscinas. Apesar de nunca ter chegado a disputar um Mundial de piscina longa, apenas de curta em Abu Dhabi-2021, chegou ao palco mais desejado de todos ao ter competido nos Jogos de Tóquio-2020, onde foi 20.º aos 200m costas (1.58,58m), a sua prova favorita, e 28.º nos 100m costas, então com recorde nacional dos 54,35.
Apesar de não considerar a possibilidade de tentar estar em Los Angeles-2028, depois de não se ter conseguido apurar para Paris-2024, o nadador da Benedita, onde começou e nadou até se mudar para o Sporting, em 2016, quando veio estudar para o Técnico, ainda começou a treinar com os leões em setembro.
«Achei que estava na altura de começar a procurar outros objetivos. A natação já não fazia sentido para mim a partir do momento em que passei a sentir que os próximos Jogos eram a muito longo prazo. Cheguei a um ponto em que uma pessoa começa a procurar novos desafios noutras áreas da vida.»
No entanto, acabou por nem participar no Nacional de piscina curta, tanque de que nunca foi grande fã e o fazia gostar pouco dos inícios de temporada, nem no Nacional de Clubes, também em dezembro. Momento habitualmente escolhido por muitos nadadores para deixarem a competição.
Assim, quisemos saber se começou a época a treinar porque depois resolveu desistir e guardar o equipamento definitivamente. «Achei que estava na altura de começar a procurar outros objetivos. A natação já não fazia sentido para mim a partir do momento em que passei a sentir que os próximos Jogos eram a muito longo prazo. Cheguei a um ponto em que uma pessoa começa a procurar novos desafios noutras áreas da vida, como, por exemplo, no trabalho. Foi basicamente por isso que decidi», diz quem há muito tirou engenharia eletrotécnica e depois especializou-se em informática.
«Depois de ter ido a Tóquio-2020, nunca mais foi, realmente, o meu maior desejo voltar a ser olímpico. Foi mais um objetivo que foi criado para mim.»
Não ter conseguido ir aos Jogos de Paris-2024 pesou muito neste percurso e para esta decisão? «Custou um bocado. No início foi mais o choque de saber que já não ia conseguir alcançar os meus objectivos. Mas, depois de ter ido a Tóquio-2020, nunca mais foi, realmente, o meu maior desejo voltar a ser olímpico. Foi mais um objetivo que foi criado para mim. Por outras palavras, o meu principal objetivo na carreira era ir aos Jogos Olímpicos e, a partir do momento em que o cumpri, senti-me um bocado vazio».
«Mas depois, com o acompanhamento de um psicólogo e tudo o resto, vi que era normal sentir-me desta forma e coloquei o objetivo de estar em Paris-2024»
«Não sei se é normal sentirmo-nos assim, mas foi como estava. Com falta de metas a alcançar», vai contando o ainda recordista nacional dos 200 costas (1.57,06m). Tempo que, em junho de 2021, lhe assegurou a ambicionada presença olímpica no Japão. «Mas depois, com o acompanhamento de um psicólogo e tudo o resto, vi que era normal sentir-me desta forma e coloquei o objetivo de estar em Paris-2024. Só que, como referi, quando notei que já não o conseguiria alcançar custou-me um bocado. Ainda tentei até à última, em abril», acrescenta.
«Quando, em janeiro, fraturei os dois pés no campeonato universitário. Numa partida de costas em que escorreguei, e não sei como, acabei por partir os pés no mesmo sitio»
E o que é que faltou desta vez para os Jogos de Paris, que não havia acontecido para os de Tóquio? «Para começar mais oportunidades», responde de imediato. «E falta de preparação. No outro ciclo olímpico tive cinco anos para me preparar para os Jogos. Período mais alargado do que o normal [devido à pandemia] e que no meu caso deu resultado. Mas, desta vez também sofri um percalço em janeiro de 2023, que não só me afetou o final dessa temporada, como o início da seguinte, que seria a de qualificação para Paris-2024», vai contando. Ainda andei a tentar recuperar o tempo e a forma que tinha, mas foi tudo um bocado a correr atrás do prejuízo. Por isso digo que faltou preparação».
«Tive um mês parado, depois comecei a retomar os treinos muito devagar porque não conseguia bater as pernas.»
Quando se refere a percalço é quando se lesionou? «Sim, quando, em janeiro, fraturei os dois pés no campeonato universitário. Numa partida de costas em que escorreguei, e não sei como, acabei por partir os pés no mesmo sitio», revela. «Tive um mês parado, depois comecei a retomar os treinos muito devagar porque não conseguia bater as pernas. Apenas comecei a recuperar no final dessa temporada e voltar ao nado normal no início da seguinte».
«Estava à procura de um método de treino mais focado no detalhe e na técnica do que um treino mais aeróbio, digamos assim. Sentia que, no Sporting, tinha um tipo de treino muito bom para pessoas que nadam fundo e meio fundo, e mesmo para as minhas provas de 200 costas, só que, para mim, isso é muito massacrante. É bastante fácil cansarmo-nos desse tipo de preparação.»
E quando, em 2022, foi para os Países Baixos, onde treinou e competiu no De Dolfijn, clube de Amesterdão, além de trabalho, pois tinha concluído o mestrado, foi em busca de quê na natação? «Estava à procura de um método de treino mais focado no detalhe e na técnica do que um treino mais aeróbio, digamos assim. Sentia que, no Sporting, tinha um tipo de treino muito bom para pessoas que nadam fundo e meio fundo, e mesmo para as minhas provas de 200 costas, só que, para mim, isso é muito massacrante. É bastante fácil cansarmo-nos desse tipo de preparação. Por isso, nos Países Baixos tentei encontrar algo com menos metros, mas mais conciso naquilo que é necessário fazer», explica Francisco, que se estreou em Europeus em Budapeste-2020 e também disputou o de Roma-2022 .
E encontrou o que procurava? «Digo que sim. Fazíamos treinos mais curtos e com os quais sentia que estava a ter resultados na mesma, mas o problema foi conciliar tudo. Apesar de lá terem horários flexíveis para quem trabalha, é complicado», justifica.
Francisco Santos anuncia fim de carreira depois de não ter conseguido chegar aos Jogos de Paris-2024. Nadou os 100 e 200 costas nos Jogos de Tóquio 2020 e ainda é o recordista nacional da segunda. Faz uma lista de agradecimentos pelo que viveu e quem conheceu na modalidade.
«Acho o CAR Jamor muito limitador em termos de horários, ou seja, temos que fazer tudo muito certinho, como se fossemos atletas profissionais. Temos que fazer muitas horas na piscina, abdicar de muita coisa na vida para só nos dedicarmos à natação»
E porque nunca foi para o CAR Jamor, onde está o Diogo Ribeiro ou o Miguel Nascimento? «O acompanhamento de certeza que seria melhor, teria sempre mais apoio, mas nunca foi algo que me encantasse muito. Acho o CAR Jamor muito limitador em termos de horários, ou seja, temos que fazer tudo muito certinho, como se fossemos atletas profissionais. Temos que fazer muitas horas na piscina, abdicar de muita coisa na vida para só nos dedicarmos à natação». afirma.
E após também ter ganho vários títulos de campeão nacional e quatro de clubes, o que é que ficou a faltar? Ir ao Mundial, chegar à meia-final nos Jogos? «Sinto que a minha missão foi cumprida depois de ter ido aos Jogos e lá ter estado ao lado e visto grandes atletas, assim como ter ido a outras competições. Aí a minha carreira ficou realizada. Ir a uns Mundiais não me iria acrescentar grande coisa. Ter ido a Tóquio-2020 permitiu-me fechar este percurso da minha vida», concluiu.