«Senti desconfiança dos diretores»: as aventuras de um treinador português no Vietname
Em entrevista a A BOLA, Mauro Jerónimo, que treinava até recentemente o PVF, afirmou que, no Vietname, ainda se sente, no meio da cultura patriótica e «fanática por futebol», a desconfiança pelos estrangeiros.
Como é a vida em Hanói?
É muito boa. Não vivo no centro. No centro da cidade é o caos total. Fora da cidade, é espetacular. Vivemos num ecoparque, com muitas residências, lagos, floresta. É espetacular. Por isso, posso dizer que é muito, muito bom. Claro que, se fosse viver no centro da cidade, no meio da confusão, aí seria caótico. Tem mais habitantes que Portugal. São 11 milhões aqueles que estão registados. Porque dizem que há mais. É muito complicado. Por exemplo: jogámos o jogo da Taça no Estádio Nacional, Normalmente não é muito longe, mas nunca se sabe o que esperar do trânsito. O trânsito é tão grande, tão grande, tão grande, que 20 quilómetros de distância, podem levar duas horas, três horas no trânsito.
Como é que se vive o futebol no Vietname?
São muito apaixonados, são fanáticos pelo futebol. Principalmente, os jogos das seleções nacionais, seja futebol feminino, seja futebol masculino, seja de futebol jovem, sub-15, sub-20, é uma loucura. Nunca vi nada disto, nem em Portugal, nem noutro lado do Mundo. As pessoas são fanáticas do futebol, mais pela seleção. São muito patriotas. Como se sabe pela história do Vietname, foi um país que foi constantemente atacado por invasores, então é um povo com muito patriotismo. No PVF, estamos a falar de um grupo de fãs recente, porque o clube é novo, não tem muita história no Vietname, atrai uma fan base de malta mais jovem, que vê o futebol da Premier League e que se aproxima da nossa identidade, porque temos um futebol atractivo, futebol de ataque, também para entretermos quem vem ao estádio._Tem vindo a crescer de ano por ano. As condições são melhores, os estádios estão melhores, os campos são melhores. Tem havido grande investimento também nas infraestruturas.
Como é que foi recebido no Vietname?
A empatia que criam contigo é boa, mas ainda há na geração dos 40 para cima um resto de negativismo ainda relativo às guerras do passado, com a América, com o Japão, com a França. Sentes que a faixa etária mais velha não é de criar amizades com estrangeiros. Na faixa etária mais jovem, as pessoas são mais abertas, têm interesse em interessar-se também pela tua cultura. Mas ainda sentes aí uma diferença, por isso também se vê que no Vietname não há muitos treinadores estrangeiros.
Aconteceu consigo?
Muitas vezes. No meu clube, por exemplo, os próprios diretores olhavam com alguma desconfiança. Também há uma cultura da idade muito enraizada, típica da Ásia. Para um treinador jovem é difícil... Não estão habituados a ter treinadores jovens. Aqui, senti vários diretores sempre muito preocupados com todas as decisões Quando demonstras o teu trabalho, e à medida que as coisas vão evoluindo, eles vão aceitando mais e vão acreditando mais em ti. Mas senti uma grande desconfiança durante algum tempo.
E sentiu a confiança dos jogadores?
Sim. Os jogadores estão muito, muito, muito abertos a aprender, a ouvir. Têm curiosidade em saber tudo e mais alguma coisa. Querem beber tudo aquilo que tu trazes. Obviamente que, vindo de Portugal, isso dá-me assim um bocadinho mais... força. Porque somos um país com os melhores jogadores do mundo, os melhores treinadores do Mundo.