Reportagem A BOLA, em Riade «Se fosse hoje faria o mesmo, apesar de me ter doído sair assim do Sporting»

FUTEBOL07:30

Daniel Podence deixou o Sporting na sequência do Academia de Alcochete, a 15 de maio de 2018. Rescindiu unilateralmente e foi para o Olympiakos. Na casa onde agora vive, em Riade, como jogador do Al Shabab, recordou o passado como jogador dos «leões» e as marcas que permanecem

Saíste de forma polémica de Portugal, na sequência ao ataque à Academia do Sporting. Procuraste depois ser feliz noutros países europeus. Regressar a Portugal foi colocado de parte? Tens medo de voltar?

Eu sinto que Portugal não é o sítio ideal para se crescer e para se continuar uma carreira futurística assim que se sai de lá, por várias razões. Sim não saí da melhor forma de Portugal, mas acima de tudo é porque há muito ruído. Não há tanto esse ruído em Inglaterra e mesmo na Grécia, para os jogadores estrangeiros, eu pelo menos não o senti.  Estava sempre um bocado à parte disso. Uma das razões é essa mesmo de ser sempre tudo muito polémico em Portugal. E a outra é porque de facto sinto-me melhor no estrangeiro. Não sei se tenho uma vida mais descansada, mas mesmo a nível da adaptação nos países em que estive, consegui adaptar-me e nunca senti a necessidade de voltar a Portugal. Se for pelo futebol, tanto a Premier League como a Grécia, acho que têm um futebol parecido e superior ao de Portugal. A nível familiar, sinto que me adaptei super bem e não vejo essa necessidade de voltar a Portugal, como acontece com muitos jogadores.

Arrependeste da forma como saíste? Se fosse hoje, seria diferente?

Não sei, foi uma situação muito específica, não consigo dizer o que é que faria ao dia de hoje. Sei sim que a decisão que tomei foi difícil, mas ao mesmo tempo foi muito acertada, porque fui para um clube, o Olympiakos, que me abriu as portas para coisas que eu nunca esperaria. Não me arrependo de nada e, pelo contrário, se fosse hoje, sairia outra vez para o Olympiakos porque foi a melhor saída possível. Fui muito feliz la, consegui depois ir para a Premier League, o melhor campeonato do mundo, e o Wolverhampton é um clube incrível, onde tive anos muito bons. Se fosse hoje faria o mesmo apesar de me ter doído sair assim do Sporting.

Quando deixsste de vez o Olympiakos, e vieste para cá, deixaste uma mensagem aos adeptos em que dizias que eram os melhores adeptos do mundo. Admites que isso possa custar a um adepto do Sporting?

Admito que possa doer, seja aos dos Sporting ou aos do Wolverhampton, mas eu quero enaltecer os adeptos do Olympiakos porque foi um clube e uma massa adepta associativa que me apoiou durante o tempo que lá estive. Durante os anos que lá estive ganhei e perdi, mas tive sempre o apoio deles.

Quiseste sair em grande com os adeptos do Olympiakos?

Sair em grande porque mesmo agora, antes de vir para cá, fizeram muita força para que eu voltasse para o Olympiakos. Eu e a minha família sentimos esse carinho. E acho que esse carinho nunca foi sentido em outro lado da mesma forma, por isso acho que também era injusto para os adeptos do Olympiakos não serem tratados da forma que merecem.

Tu fizeste toda uma caminhada no Sporting e ganhas o amor de que falas ao Olympiakos. Portanto, aquela máxima de que não se muda de clube é mentira?

Sim, eu acredito que é mentira. Depois de muito tempo num clube a ser tratado de uma forma que nunca se foi tratado, acho que é difícil não se sentir. A Grécia e Portugal são coisas diferentes. Eu bem que posso ser do Sporting, que sou em Portugal, como ser do Olympiakos na Grécia. Mudando de clube também não implica que não se possa ter dois, desde que não sejam do mesmo país.

Até porque assim podes celebrar os títulos do Sporting em Portugal, os do Olympiakos na Grécia e quem sabe também aqui na Arábia?

Sem dúvida. (Risos)

Entrevista a Daniel Podence em Riade, na Arábia Saudita

Se eu sou o que sou hoje é pelo que o Sporting fez por mim. Não podia esperar que aos 18, 19, ou 20 anos o Sporting, me desse o protagonismo que eu queria

A tua mágoa com o Sporting é só pelo que se passou na Academia?

Eu não tenho mágoa no Sporting. Pelo contrário. Se eu sou o que sou hoje é pelo que o Sporting fez por mim. Eu joguei no Sporting desde os 9 anos até os 22 anos. Mais de metade da minha vida, foi passada na Academia. No Olympiakos era um jogador diferente, tinha uma idade diferente e uma maturidade diferente do que tive no Sporting. Então eu não podia esperar que aos 18, 19, 20 anos o Sporting, ou as pessoas que estavam no Sporting me dessem o protagonismo que eu queria. Não era isso que eu esperava, até porque havia muitos jogadores de qualidade à minha frente. O Gelson, o Bryan, o João Mário, etc, etc. Não tenho de maneira nenhuma mágoa. O que eu sinto é que podia ter saído de uma forma diferente, mas as pessoas que lá estavam na altura quiseram complicar e a coisa não se deu bem. A minha única mágoa é da forma como saí. Os últimos seis mese,s ou um ano lá, para mim foram muito difíceis. Pela lesão, pela pressão que havia lá dentro... Ao dia de hoje acho que é tudo muito diferente no Sporting.

Por toda essa tua história no Sporting, por este Sporting ser diferente do teu Sporting daquela altura, tens pena de não teres tido este Sporting?

Claro que sim, acho que todos os ex-jogadores do Sporting sentem que este Sporting é um Sporting muito diferente dos últimos 20 anos. A estabilidade é outra, a maneira como se aborda o futebol, e todos os assuntos relativamente ao futebol, é diferente, para melhor. E acho que para qualquer jogador se torna muito mais fácil viver num ambiente assim e jogar numa equipa assim. Seja eu ou seja qualquer outro ex-jogador, sente que este Sporting, pela qualidade das pessoas que estão lá a trabalhar, é um Sporting onde os jogadores estão mais preparados para vencer e para ter sucesso.