BÉRGAMO - Sporting e Atalanta foram dois clubes especiais na carreira do argentino que, aos 34 anos, ainda joga na 4.ª divisão em Itália. Em conversa com A BOLA abre o coração aos adeptos garantindo que a saída de Alvalade nunca partiu dele. A vontade seria ficar… até hoje. Histórias que ficaram por contar, sem qualquer tipo de ressentimento e ambição de um dia voltar a pisar Alvalade para ouvir os aplausos dos adeptos, que são «únicos no mundo»
- Ainda antes de falarmos sobre o Sporting… ainda tem forças para continuar. Como tem sido jogar no Barletta 1992?
- Estou em Itália, no Barletta Calcio, uma equipa de 4.ª divisão. Foi uma decisão que tomei porque queria voltar a jogar em Itália. Mas hoje penso que foi decisão apressada, devia ter pensado mais com a cabeça fria. Quando terminar esta liga espero continuar a jogar mais três, quatro, cinco anos mas em outro campeonato, com outro nível. Numa Série B ou A, vamos ver quando abrir o mercado.
- São esses os planos aos 34 anos? Jogar mais cinco anos?
- Tenho outros... Quando terminar de jogar quero tirar o curso de treinador, mas neste momento quero jogar mais três, quatro, cinco anos. Espero, para já, jogar num campeonato mais profissional. Pensei que a 4.ª divisão em Itália seria uma decisão boa, mas aconteceram muitas coisas nos últimos meses. Ficámos sem treinador, já vamos no terceiro da época, 60 companheiros de equipa, é muito difícil e não estou preparado para isso. Pensei que sim, mas não estou preparado.
- Vamos então ao Sporting. Foram apenas duas épocas, mas todos se recordam de Schelotto. Esse foi o melhor troféu que levou de Portugal?
- O Sporting é um clube especial. Desde logo porque foi o primeiro que representei depois de sair de Itália. Estive ali quase oito anos e foi o primeiro país pós-Itália. Sabia que estaria longe da família, amigos, pais, irmãos… Mas cheguei e senti logo o amor de quem é bem recebido. De um clube, cidade, adeptos, dirigentes, treinador… na verdade nunca senti falta de nada! Foram dois anos lindos, nos quais aprendi muito, conheci gente que ainda hoje são meus amigos. Sinto uma admiração linda com o Sporting, Lisboa e Portugal. É um país maravilhoso.
- Essas saudades parecem evidentes. Vai a Portugal com frequência?
- Sinto muitas saudades! Porque fui ali muito feliz, vivi dois anos muito lindos. Desde que saí para Inglaterra voltei para visitar Coates e a sua família e também Bryan Ruiz, dois amigos que ficaram e com quem estou em contacto. Existe forte ligação entre nós. O Bryan Ruiz voltou para a Costa Rica, Coates ainda continua e são dois amigos. Mesmo separados, cada um no seu país. Quando terminarmos de jogar, os três, o Bryan já terminou, acredito que estaremos mais próximos. Lisboa foi também onde nasceu a minha filha Isabela, no hospital da Luz, a 17 de abril de 2017, logo também significa família.
«Terminei a chorar»
- Levou amigos, mas faltou aquela conquista de um título…
- Se existe algo que faltou no Sporting, a nível pessoal, foi um título. Nos primeiro anos, em 2015/2016, fizemos um campeonato muito bom, mais de 80 pontos! Mas aquele jogo com o Benfica em que perdemos por 0-1 foi um momento difícil. Faltavam 12 jogos para terminar e recordo-me que o Sporting jogava sempre primeiro, vencíamos, mas depois o Benfica voltava a ganhar e ficava com dois pontos na frente. Foi uma vantagem decisiva porque nenhuma equipa se rendeu, vencemos em Braga, 4 ou 5-0, no FC Porto por 3-1…
- Foram momentos complicados?
- Terminei essa época muito triste, a chorar, porque tínhamos feito um grande ano e não conseguimos o título que o Sporting perseguia há mais 15 anos. Sair sem ganhar um título foi difícil. Porque queria, necessitava muito e, sobretudo, porque o Sporting merecia. Os adeptos sabem tudo o que sofri por aquela camisola. Fico feliz pelo que fiz, os adeptos nunca me esquecem, escrevem-me e mandam-me mensagens. Gostaria de voltar um dia, como jogador talvez não, mas regressar a Alvalade para poder abraçar todos os adeptos que são muito especiais.
- Vamos recuar mais… o que o fez aceitar o convite do Sporting naquela altura. Era jogador do Inter, certo?
- Verdade. Estava no Inter e um dia, em 2015, talvez em agosto ou setembro, recebo a chamada de Jorge Jesus a manifestar a vontade para jogar no Sporting. Nesse momento, para mim, era difícil porque tinha rescindido com o Inter, estava livre, e queria esperar porque em toda a minha vida tinha jogado em Itália. Voltou a ligar-me, uma segunda vez, uns dias depois, e mais ao pormenor explicou-me tudo o que era o Sporting, como trabalhava, o que queria de mim. Sempre joguei como extremo mas disse-me logo que era para ser lateral-direito. Depois, a tentar saber mais do clube, vi a sua história e os jogadores importantes como Ronaldo, Figo, Quaresma, Nani. Sabia que tinham jogado em Alvalade, assim como um argentino muito importante como foi Beto Acosta…
«Jorge Jesus foi um pai para mim»
- Um desafio: existe algum episódio que nunca tenha contado e que o tenha marcado muito nessa passagem por Alvalade?
- Vivi momentos lindos mas também complicados. Talvez aqueles dias em que queria ficar no Sporting, mas saiu tudo ao contrário e acabou por ser desilusão. Tinha sido pai há poucos meses e quando terminou o campeonato foi muito difícil. Porque não ia entrar nos planos do próximo ano e fiquei mal. Dei sempre tudo pela camisola do Sporting e voltar dessas férias para me dizerem aquilo… foi difícil. Passei semanas sem treinar, sem saber o que fazer, depois chegou a chamada do Brighton, mas queria ficar no Sporting. A parte boa é que sei que todos ficaram a saber que pessoa sou, alguém que dá tudo quando entra no campo. Essa foi uma das minhas maiores vitórias no Sporting.
- O que ficou?
- As coisas bonitas dos adeptos, companheiros, das instruções de Jorge Jesus, que foi o treinador mais forte que tive na minha história. Falarei sempre bem dele. Espero um dia voltar a estar junto com ele para falarmos de muitas coisas. Foi como um pai para mim.
– Tem uma ligação quase umbilical com o futebol italiano, também com a Atalanta clube que representou de 2011 a 2013. Esta jogo com o Sporting será, por certo, especial. Vai torcer por quem?
- Vi o primeiro jogo, o empate 1-1 de Alvalade, mas não tenho uma preferência. O Sporting é para mim muito importante, a Atalanta também porque são dois clubes que me deram a possibilidade de fazer grandes anos na carreira, muitos amigos, equipas que merecem ficar no mais alto patamar europeu. Vamos ver o que vai acontecer. Será um jogo muito duro, os jogadores vão dar tudo, sem que são capazes de deixar a vida em campo, vamos ver. São duas equipas especiais, gostava que passassem as duas, mas isso não será possível, então que passe a melhor.
Não será fácil, em Bérgamo é complicado. Mas o Sporting tem um treinador e jogadores top e só precisam de estar tranquilos. Se deixarem tudo em campo vão regressar a Lisboa com a vitória.
- O Sporting empatou em Alvalade. É possível continuar na competição?
- O Sporting entrou bem nos primeiros minutos em casa, os últimos foram da Atalanta. A eliminatória está aberta, mas o Sporting tem de ficar tranquilo, pois tem jogadores muito fortes, importantes, com grande nível e um capitão com uma garra impressionante. Coates é indiscutivelmente grande nesta equipa, sou apaixonado pela garra que tem. Não será fácil, em Bérgamo é complicado. Mas o Sporting tem um treinador e jogadores top e só precisam de estar tranquilos. Se deixarem tudo em campo vão regressar a Lisboa com a vitória.
- Além da Liga Europa, o Sporting joga para ser campeão. Gostaria de vir a Portugal para festejar o titulo?
- O Sporting demonstrou, nos últimos anos, ser uma equipa difícil, muito forte, com adeptos fervorosos. Se o Sporting for campeão serei o homem mais feliz do mundo. Espero que isso aconteça. Acredito mas temos de esperar porque estes jogos de final de Liga podem ser complicados. Voltar para festejar? O que quero é voltar a Alvalade para que todos os adeptos me recebam com um aplauso. São os mais fortes que vi em todo o mundo. Joguei em Itália, Argentina, Inglaterra, mas os do Sporting são o número 1. E sim gostaria que Coates pudesse levantar outra taça. É um amigo e grande capitão.
Ala argentino revela as vezes que o treinador lhe ligou para o convencer sobre o projeto do Sporting. O mesmo treinador que, mais tarde, haveria de lhe dizer que não contaria com ele