Retoques, ambição e a herança pesada: tudo o que disse João Pereira

NACIONAL11.11.202413:27

Novo treinador oficializado faz apelo aos adeptos. Falou em privilégio, prometeu trabalho, reconhecendo que a herança é pesada. União e dar continuidade ao trabalho de Amorim é a missão

«Primeiro dizer que é um orgulho, um privilégio e uma honra estar aqui hoje perante vocês a ser apresentado como treinador do Sporting Clube de Portugal. Quero agradecer ao presidente, ao Viana e a toda a Administração pela confiança depositada em mim e na minha equipa técnica para liderar este projeto nesta nova etapa. Depois, queria deixar uma palavra de agradecimento ao Ruben por tudo o que fez pelo futebol português, mas principalmente por aquilo que fez e conseguiu no Sporting. O Ruben deixa um legado, e o legado não foram só vitórias, conquistas e recordes, também é a união que conseguiu criar no seio da família sportinguista. Quanto ao futuro, sei que esta posição me traz uma grande responsabilidade, mas essa responsabilidade vem de mãos dadas com uma grande ambição e uma grande motivação de continuar a fazer o Sporting um clube vencedor e um clube de futuro. Depois, aos nossos adeptos, gostaria de dizer e pedir que continuem a apoiar a equipa como têm feito nos últimos tempos, porque juntos, a caminharmos juntos de mãos dadas, estaremos sempre mais perto da vitória. Obrigado», foram estas as primeiras palavras de João Pereira enquanto treinador do Sporting, antes de responder às questões dos jornalistas.

- Quando terminou a carreira disse que a única mágoa, aquela única percentagem de coisa que não ficou atingida, foi não ter dado tantos títulos ao Sporting como gostaria. E agora?

- Agora quero corresponder dando mais títulos e passando um pouco essa mágoa que tenho do meu passado no Sporting, porque o Sporting deu-me muita coisa. O Sporting permitiu-me ir à Seleção, o Sporting permitiu-me fazer uma transferência na altura para uma das melhores ligas do mundo. O Sporting permitiu-me voltar a casa duas vezes e eu correspondi apenas com dois títulos, com uma Supertaça e com um Campeonato que já estava a meio, acho que esse campeonato foi-me mais oferecido do que eu tive mérito nele. E é uma mágoa que tenho. Gostava de, agora nesta nova etapa da minha carreira como treinador, conseguir corresponder com mais títulos porque o Sporting merece.

 - Já falou em herança, é pesada pela positiva? O Sporting está com 11 vitórias em 11 jogos no campeonato, perdeu a Supertaça, está na Liga dos Campeões, Taça de Portugal, Taça da Liga, em todas as frentes. Quando Amorim foi apresentado disse 'E se corre bem?', na sua cabeça aparece-lhe algum, 'e se corre mal', tendo em conta que está a receber este prato tão completo?

- Se tivesse dúvidas e se viesse para aqui a assumir este lugar a pensar que poderia correr mal, não estaria aqui e com certeza estaria em casa com os meus filhos a aproveitar a minha folga. Não me passou pela cabeça que pode correr mal. Sei que ainda faltam muitos jogos até ao final da temporada. Sei que vamos passar por algumas dificuldades, mas temos que ser positivos. E eu estou confiante que as coisas vão correr bem.

João Pereira não quer defraudar expectativas (Miguel Nunes)

- Foi você quem escolheu Luís Neto para a equipa técnica? Deixou de jogar aqui há pocuo tempo, será fundamental para a união do balneário?

- Sim, o Neto foi eu que pedi ao presidente e ao Viana, por toda a experiência que tem como futebolista e porque é um elemento, como todos os outros da minha equipa, em quem deposito bastante confiança, que vai ter um papel fundamental no dia a dia do nosso clube. O Neto, com a sua experiência, pode ajudar em muitos campos que outros, infelizmente, ou não, não foram jogadores. Outros começaram muito cedo a ser treinadores e, por isso, neste momento estão preparados para o desafio que aí vem. O Neto traz outra experiência e acho que vai ser muito importante para o futuro do Sporting.

- Ao longo dos últimos meses, enquanto orientou a equipa B, como é que foi a relação com o Ruben Amorim? Que tipo de sinergia havia até a nível de preparação ou a aprendizagem que poderá eventualmente ter passado?

- A relação entre a equipa profissional e a equipa B era muito comum, porque temos muitos jogadores da equipa B a treinar na equipa A e havia sempre uma conexão muito boa, uma comunicação muito limpa e muito clara, porque tanto o Ruben, como disse anteriormente, não queria estragar as dinâmicas e a preparação dos jogos da equipa B e tinha muito cuidado com isso. Depois, tenho de lhe agradecer também, porque sempre me abriu as portas para tirar alguma dúvida, para ver os jogos e os treinos, principalmente os treinos da equipa principal, sempre me abriu as portas. Ele deixava-me ir, tenho que lhe agradecer por isso. E depois, quanto ao cunho que eu e que esta equipa técnica vamos deixar, ou vamos tentar implementar no Sporting, vai ter que ser com calma, vai ter que ser com paciência, vamos tentar ganhar a confiança dos jogadores, porque a verdade é que foram quatro anos e meio de uma liderança e isso não se muda de um dia para o outro. Vai ser preciso algum tempo, mas com certeza no futuro vocês vão notar algumas diferenças.

- O que é que acha que pode acrescentar a este legado? Há uns anos dizia que queria ser treinador, alguma vez pensou que quando disse as palavras chegasse a este patamar?

- Sou sincero, quando disse que queria ser treinador, o objetivo era sempre ser treinador de um grande clube. Felizmente consegui nesta casa, que posso considerar que é a minha casa, já aos anos que eu passo aqui. Nessa altura, se calhar, não esperaria que fosse tão rápido. Mas, a verdade é que a oportunidade surgiu e eu e a minha equipa técnica estamos preparadíssimos para os desafios que aí vêm.

- Muitas das pessoas que estão em casa a vê-lo lembram-se do João Pereira jogador, mas quem é o João Pereira treinador? O que é que lhe pediram?

- A mim pediram-me para ser eu próprio. E o maior erro seria eu querer imitar alguém. Acho que isso seria um erro. Como já disse anteriormente, isto é uma liderança de cinco anos e as coisas têm de ser passo a passo, com calma. Não é de um dia para o outro que se vai mudar tudo, porque isso também seria um erro e eu tenho consciência disso. Sou um treinador que detesta perder, adoro ganhar, sou muito competitivo, quero que as minhas equipas sejam muito aguerridas e depois sou uma pessoa muito mais calma do que aquela quando era enquanto jogador.

- Ruben Amorim disse que não tinha arrumado o escritório. Por acaso já lá foi dar uma vista de olhos?  

- [Risos] Ainda não fui ao escritório ou ao gabinete porque ontem tivemos jogo, foi em Oliveira do Hospital, que, infelizmente, não correu da melhor maneira. Já chegámos tarde. A única alegria que tivemos ontem foi o resultado do Sporting que ouvimos no autocarro. Foi a melhor maneira de acabar o dia. Ainda não fui ao gabinete. Iremos todos no final desta apresentação. Há uma coisa que levo do Ruben. Uma vez teve uma conversa comigo e é um conselho que eu vou levar para a vida: 'João, sempre que queiras inserir um comportamento, uma nova dinâmica, uma coisa nova na tua equipa e não consigas numa frase simples ou numa palavra explicar isso é porque ainda não estás preparado para passar'. E isso ficou-me na cabeça. Nós quando queremos passar alguma coisa aos jogadores temos que estar bem claro na nossa cabeça e ter uma mensagem clara para ser fácil para o jogador perceber. E até nisso tenho que lhe agradecer.

- Quando o presidente lhe ligou a dizer é seria mais cedo que chegaria aqui, o que é que pensou e como é que se preparou sete meses antes do previsto?

- Pensei que tinha de ganhar ao Lusitânia. Foi antes do jogo do Lusitânia, lembro-me como se fosse hoje. Tinha acabado de sair da palestra pós-jogo e tenho o presidente ao telefone a dizer 'prepara-te, pode ser mais cedo'. Isto era um processo que estava a ser preparado há muito tempo, antes até da saída do Amorim agora, estou preparado. E a preparação não foi feita nesta última semana. A preparação tem sido feita nos últimos anos. Seria um erro meu só me tentar ter preparado na última semana. Fiz o trabalho de casa e, por isso, tenho confiança naquilo que posso trazer ao clube e a minha equipa técnica também.

Frederico Varandas disse que o Sporting vai proteger João Pereira (Miguel Nunes)

- Certamente está ansioso por começar a trabalhar no terreno. Não vai ter muitos jogadores, face às ausências dos internacionais, já teve algum contacto com o grupo? Se sim, como foi recebido? Depois terá pela frenrte uma eliminatória da Taça de Portugal e o Arsenal. Começa com um ciclo complicado?

- O que é de louvar, é sinal que o Sporting tem uma equipa de grandes jogadores e todos vão representar as suas seleções. Depois tenho o lado mais positivo, vou continuar a trabalhar com muitos dos jogadores de quando treinava na equipa B, vão ser chamados para completar o plantel [risos]. O ciclo, começamos com o Amarante, depois temos o Arsenal, depois o Santa Clara, a equipa revelação da Liga, mas vamos pensar jogo a jogo. O jogo mais importante, neste momento, é o jogo do Amarante. Não vamos ter muito tempo para o preparar, pelo menos com todos os jogadores. Mas, com certeza, vamos estar preparados para o que aí vem.

- Já aqui se e falou dos números do Sporting nesta época, 11 vitórias nas 11 jornadas. O Sporting está lançado na Liga dos Campeões e em todas as provas. Ruben Amorim, há pouco tempo, disse que se sentia invejado. Você, ao assumir este cargo, sente-se um treinador privilegiado, ou por outro lado, ainda mais pressionado por estes números?

- A pressão faz parte do futebol, já quando era jogador. E se calhar tenho uma bagagem por ter passado muito dessa pressão, ter essa pressão sobre mim quando era jogador, nos vários clubes por onde passei. E se calhar ajuda-me a suportar a pressão, é normal. As pessoas vão estar curiosas, algumas vão ter algumas dúvidas. Mas o mais importante e fundamental é eu e a minha equipa técnica não termos dúvidas. É aquilo que podemos fazer.

- Os jogadores já admitiram que irão sentir saudades de Ruben Amorim. Vai, certamente, haver uma mudança no estilo de liderança. Qual vai ser o seu primeiro passo para conquistar a confiança dos jogadores?

- É verdade, volto a repetir, foram quatro anos e meio de uma liderança onde muitos dos jogadores que fazem parte deste plantel foi o Ruben que os foi buscar. Desenvolveu uma grande relação com todos eles. E claro que, precisamente nesta altura, a minha relação com eles não vai ser igual. Mas é uma relação que vai evoluir, que vai se implementar. E se continuarmos a ganhar, com certeza vai crescer. E a confiança que eles tinham no Ruben Amorim vão ter em mim.

- Num ponto de vista mais tático, quais são os valores e os aspectos que prioriza na sua forma de jogar? E quais são as maiores semelhanças, também diferenças, para o estilo de jogo de Ruben Amorim?

- Quem estava atento à equipa B este ano e aos sub-23 nas épocas anteriores viu que muitas vezes éramos comparados com a equipa principal, pelo nosso sistema de jogo principalmente ofensivo, que é muito parecido, tem muitos comportamentos iguais aos da equipa A. E acho que isso vai ajudar na nossa adaptação, porque os jogadores já têm muitos desses comportamentos. E nós, aos poucos, vamos tentar introduzir a nossa mãozinha, dando uns retoques sempre pelo objetivo de tornar o Sporting ainda melhor. Depois, as minhas ideias de jogo são uma equipa consistente defensivamente, uma equipa pressionante, não deixar os adversários confortáveis com bola. E depois, ao contrário, quando nós temos bola, estarmos confortáveis com ela, saber o que temos de fazer, saber os posicionamentos uns dos outros, saber os sítios onde temos de atacar, saber os espaços livres e é isso.

- Cresceu na Meia Laranja, no Casal Ventoso, e agora está aqui, em frente à porta 10A. Olhando para o seu percurso o que é que lhe passa pela cabeça e o que é que disse ao seu pai?

- Ainda não falei muito bem com meu pai, porque quando eu já sabia que isto ia acontecer, a única pessoa que sabia também, além do presidente e do Viana, era a minha esposa. E mais ninguém sabia, nem mesmo a minha equipa técnica. Porque não queria criar distrações, não queria criar foco de distração, tanto para a equipa principal como também para a equipa B. E acho que só hoje, depois que eu sair daqui, é que vou dar um grande abraço ao meu pai, porque toda a gente sabe, toda a gente não sabe, mas muita gente sabe, que foi e continua a ser um grande sportinguista [olhos marejados]. E uma das maiores alegrias que eu lhe dei foi ter sido campeão aqui, com os meus filhos, aqui em campo, o meu filho mais velho, o mais novo ainda não era nascido, e ele ter a possibilidade de pisar o relvado comigo. Estou um pouco emocionado, é normal, porque o meu pai vive muito isto. E acredito que esteja a chorar em casa agora a ver isto. Um abraço para ti.