João Pereira: da luta constante para ser melhor à aposta de Varandas
João Pereira sucede a Ruben Amorim

O SUCESSOR DE AMORIM João Pereira: da luta constante para ser melhor à aposta de Varandas

NACIONAL29.10.202414:10

A irreverência que o caracterizou como jogador ainda não foi completamente ultrapassada, mas «as boas ideias que tem» convenceram o presidente que está, há muito, a preparar a sucessão de Amorim

João Pereira é a aposta que Frederico Varandas tem vindo a preparar para suceder a Rúben Amorim no comando técnico do Sporting. A BOLA sabe que há muito que o presidente dos leões acredita que o atual treinador da equipa B tem competências para assumir a equipa principal, e na Academia Leonina tem sido feito trabalho nesse sentido.

Ainda que de forma muito discreta, A BOLA sabe que João Pereira foi inscrito na época passada como adjunto da equipa principal e por isso conseguiu entrar no curso UEFA A que decorreu este ano no verão, em regime de internato, pois caso contrário não teria conseguido vaga como treinador da equipa B, dado o grande número de treinadores inscritos para o efeito. O objetivo do Sporting foi criar condições para João Pereira tirar o terceiro nível de qualificação da UEFA o quanto antes, por forma a estar mais preparado para quando chegasse a hora de assumir a equipa principal.

João Pereira «ainda está em fase de estágio e tem de entregar as tarefas complementares até final de 2024, mas é provável que o certificado só seja entregue no final da temporada», diz-nos fonte do clube. No entanto, o facto de estar a frequentar o curso dá-lhe habilitações de ter o UEFA A (antigo terceiro nível), mas não o UEFA PRO, exigível para treinar a equipa A. Com a saída de Rúben Amorim, João Pereira poderá substituí-lo no cargo pois terá como adjunto na equipa técnica Tiago Teixeira, que tem a formação exigida para assumir uma equipa na Liga (UEFA PRO).

Quem diariamente trabalha na Academia do Sporting não se mostra nada surpreendido com esta subida iminente de João Pereira pois sabem o trabalho que tem sido feito nesse sentido. Reconhecem competências e «muito boas ideias» ao antigo lateral e acreditam que, à semelhança de Rúben Amorim, também ele pode dar certo. Apontam apenas um receio: o temperamento.

Chamada de atenção pelo comportamento no banco

Frederico Varandas e João Pereira conheceram-se no Sporting quando o lateral por lá jogou e o agora presidente era médico da equipa principal. Na época falaram muito de futebol e as ideias que tinha fizeram com que Varandas assumisse em maio de 2020 que João Pereira iria ser treinador. Na altura questionado por A BOLA, João Pereira admitiu sentir-se «contente por Varandas falar» nele. «Penso que ele disse isso porque no Sporting conversávamos e ele deve ter percebido que poderia abraçar a carreira de treinador. É claro que fico orgulhoso, por ser a pessoa que é a referir-se a mim», revelou-nos João Pereira, que vestiu a camisola dos leões entre 2009 e 2012, 2015 e 2016, e em 2020/2021 quando foi campeão com Rúben Amorim.

Acabou por começar como treinador-adjunto da equipa de sub-23 em 2021/2022, assumindo o cargo de principal em 2022/2023. Fez 15 jogos e conseguiu quatro vitórias, mas mais do que os resultados o que irritou o presidente do Sporting, e a restante estrutura, foi o comportamento de João Pereira na altura no banco. No final da época houve uma reunião, sabe A BOLA, em que ficou claro que a aposta era que João Pereira assumisse a equipa B, no espaço de dois anos, mas para isso acontecer o treinador «precisaria de se controlar no banco e não podia reagir com os adversários e com os árbitros como reagia. Teria de mudar», dizem-nos. E mudou.

Determinado a controlar a irreverência que marcou a carreira como jogador, João Pereira trabalhou no sentido de emocionalmente ser mais ponderado, não prejudicando as boas ideias de jogo que tem com traços de personalidade.

Com um temperamento mais polido, João Pereira assumiu, como planeado, a equipa B esta temporada, e foi Rúben Amorim a anunciá-lo, inadvertidamente, a 17 de maio deste ano, na conferência de imprensa de antevisão do jogo com o Chaves. Agora as portas da equipa principal do Sporting abrem-se para João Pereira, precisamente numa altura em que Amorim é chamado pelo Manchester United.

Foi a vida que o moldou

João Pedro da Silva Pereira nasceu em Lisboa 25 de fevereiro de 1984 e cresceu no problemático Casal Ventoso, com as dificuldades financeiras e a delinquência que sempre caracterizaram este bairro lisboeta. João Pereira, baixinho de tamanho, mas, «com pêlo da venta», como diz quem com ele privou na infância, sempre quis ser grande. Determinado desde miúdo, encontrou no futebol uma forma de ser feliz.

A tarefa nunca foi fácil e o feitio rebelde da juventude nem sempre ajudou, mas João Pereira foi conquistando espaço nos clubes por onde passou. Começou no Domingos Sávio, depois formou-se no Benfica. Destacou-se nas camadas jovens da Luz e tornou-se internacional em todos os escalões jovens de Portugal, destacando-se na seleção de sub-19 que esteve no Europeu de 2003, onde Portugal perdeu na final com a Itália (2-0).

Conquistou espaço no plantel principal do Benfica logo de seguida e foi orientado por José António Camacho na Luz, jogando mais avançado no terreno. Em 2004/2005 foi campeão no Benfica de Trapattoni. Conquistou uma Supertaça e uma Taça de Portugal. Foi precisamente numa eliminatória da Taça, em 2005, que teve um dos episódios marcantes da carreira num escaldante Benfica-Sporting (as águias venceram nos penáltis 7-6) ao simular uma agressão de Hugo Viana, provocando a expulsão do então médio do Sporting.

Na época de 2005/06, João Pereira perdeu espaço no Benfica e foi emprestado ao Gil Vicente, onde esteve até terminar a sua ligação aos encarnados. O SC Braga contratou-o e por lá ficou até o Sporting pagar a cláusula de rescisão (3 milhões de euros) para o tornar no primeiro reforço de inverno dos leões, treinados por Carlos Carvalhal, que demonstravam várias fragilidades.

Ganhou espaço na equipa leonina e conquistou a lateral-direita. Em outubro de 2010 foi pela primeira vez chamado à Seleção A, por Paulo Bento que também se estreou como selecionador nesse jogo com a Dinamarca, no Dragão (3-1). Esteve no Euro 2012 e no final da temporada o Sporting vendeu-o ao Valência, por cerca de 3,7 milhões de euros, quando tinha apenas mais um ano de contrato.

Depois de Espanha tornou-se ainda ídolo no Trabzonspor, da Turquia, onde esteve 4 anos, quase sempre como titular e de onde saiu com direito a homenagem. Regressou a Alvalade para acabar a carreira e consolidar o carinho dos sportinguistas que, indiferentes a alguns excessos resultantes do temperamento da juventude, o viram crescer como treinador e depositam confiança no homem que está nas bocas da atualidade leonina com a cadeira de treinador principal à distância de uma assinatura.