César Boaventura: «É sabido que o FC Porto é o meu inimigo público»
César Boaventura. (Imagem: Sérgio Miguel Santos ASF)

César Boaventura: «É sabido que o FC Porto é o meu inimigo público»

NACIONAL17.01.202417:27

César Boaventura continua a ser julgado pelos crimes de aliciamento a três jogadores do Rio Ave e um do Marítimo para favorecer o Benfica, em troca de dinheiro, referente a jogos da época 2015/16.

Na segunda sessão do julgamento, César Boaventura, arguido no processo, referiu que tudo isto não passa de um plano de difamação por parte de outros clubes portugueses, nomeadamente o FC Porto.

«Em dezembro de 2016, fui contatado por um clube do norte para ter uma reunião num hotel em Esposende. Essa pessoa era Urgel Martins (FC Porto) e disse-me que sabia que o Benfica andava a aliciar os jogadores e que sabia que não era eu, mas como a minha ligação ao Benfica era pública, seria mais vantajoso precaver-me. Essa pessoa disse-me que o clube (FC Porto) queria vender um jogador por 22 milhões de euros e eu ganharia dois de comissão. É sabido que esse clube é o meu inimigo público. Francisco J. Marques (diretor de comunicação do FC Porto) disse, no Porto Canal, para ninguém se aproximar de clubes que vão jogar contra o Benfica…», disse, esta quarta-feira, o empresário de futebol, no Tribunal de Matosinhos.

César Boaventura diz ter «melhores relações com outros clubes do que com o Benfica» e que a ligação com Luís Filipe Vieira «passou de uma relação profissional para pessoal», sublinhando que nunca foi «jantar a casa» do ex-presidente do Benfica.

Sobre os jogadores, César Boaventura nega qualquer tipo de contacto com os jogadores visados no sentido de os ter aliciado. Eis as declarações sobre as testemunhas em julgamento.

Lionn

«A única vez que estive com o Lionn foi na discoteca Pacha, em Ofir, em 2014. Encontrei-o lá e falamos por cinco minutos. Antes disso, só o conhecia pela televisão. Nunca o contactei por telefone, era um jogador que não me despertava interesse profissionalmente».

Marcelo

«A primeira vez que estive com o jogador foi em julho de 2016. Na altura enviei-lhe uma proposta do Alavés. O Rio Ave e o jogador aceitaram, mas não conseguiu o passaporte comunitário e, por isso, o negócio acabou por não acontecer. Quando o jogador foi para o Sporting garanto que não foi escolha do treinador, houve outros interesses».

Cássio

«Nunca falei com o jogador, nem pessoalmente nem por telefone. Ele disse-me que estava em final de contrato, mas tinha acabado de renovar o contrato com o Rio Ave. Em Portugal, um jogador médio ganha cerca de 100 mil euros ao ano, pode chegar aos 150 mil, e depois são movidos por causas extra futebol, como as casas de apostas… Como não conseguem dizer ao clube que têm mais uma lesão, podem chegar a inventar uma desculpa para não jogar, fragilizando assim as equipas onde jogam. Isto porque ganham mais nas apostas do que nos clubes».

Romain Salin

«Fui até à Madeira e encontrei-me com o Salin em casa do jogador. Havia uma proposta de um clube da Turquia na ordem dos 300 mil euros limpos ao ano, era uma proposta verbal. Ele disse-me que ia esperar por mais propostas. Isto aconteceu uma semana antes do jogo do Marítimo com o Benfica. Tal como o Marcelo, o Salin depois foi para o Sporting».

Pedro Martins afirma, agora, que «três jogadores do Rio Ave foram aliciados por um agente»

Pedro Martins testemunhou, uma vez que era o treinador do emblema de Vila de Conde na altura, no julgamento, referindo que os três jogadores do clube confessaram-lhe que foram abordados por um agente, poucos dias antes do jogo com o Benfica.

«No início da semana de preparação do jogo com o Benfica, dois jogadores foram ao meu gabinete e informaram que tinham sido aliciados pelo agente (sem precisar o nome) no sentido de perder o jogo. A partir desse momento informei a quem tive de informar, os responsáveis do Rio Ave. Os três atletas estavam incomodados, era notável e pediram para não jogar porque estavam apreensivos, pedido ao qual recusei», disse Pedro Martins, sublinhando que não assistiu nada de anormal durante o jogo com o Benfica.

O treinador português contrariou o testemunho de 2017, tendo na altura dito que apenas foi abordado por dois jogadores,. Na altura, não referiu o nome de Cássio.

Incongruências nas declarações fiscais

Nesta segunda sessão do julgamento foram analisadas as proveniências de valores que deram entrada na conta bancária do arguido, em que foram detetadas incongruências nos valores declarados e recebidos nos últimos cinco anos, de acordo com Tiago Vitorino, inspetor da PJ no Gabinete de Recuperação de Ativos.

Sabe-se que César Boaventura recebeu, entre outros valores avultados, cerca de 300 mil euros na sua conta bancária, desconhecendo-se, para já, o motivo. Sabe-se é que este é o valor que o empresário terá oferecido alegadamente a um dos jogadores em forma de promessa de um contrato num clube estrangeiro em troca de favores.

O processo

Todo este processo remonta à reta final da temporada 2015/16, numa altura em que o Benfica liderava o campeonato com mais dois pontos que o Sporting. Os encarnados, que haviam de se sagrar tricampeões nesse ano, jogaram em Vila do Conde em 24 de abril e saíram de lá com um triunfo (1-0) na 31.ª jornada.

O lateral Lionn, terceiro jogador rioavista envolvido no processo e que não jogou essa partida com os encarnados, voltou a faltar à audiência, com o grupo de juízes a anunciar «que não foi possível estabelecer contacto com a testemunha». 

Na primeira sessão, que decorreu na semana passada, Cássio e Marcelo, então jogadores do Rio Ave, confirmaram que foram abordados pelo empresário de futebol. O guarda-redes afirmou que recebeu uma proposta de 60 mil euros para favorecer o Benfica, enquanto o defesa-central pensou tratar-se de uma brincadeira, o que contrariou o depoimento feito em 2017.

Romain Salin, guarda-redes do Marítimo, é o outro jogador envolvido no processo. O Benfica jogou na Madeira em 08 de maio, na penúltima jornada, e venceu por 2-0.

Este processo não visa o Benfica, uma vez que não ficou provado que o empresário de futebol atuava em nome de dirigentes do clube lisboeta.

Este é o segundo processo a envolver César Boaventura, depois de ter sido acusado pelo Ministério Público de 10 crimes na Operação Malapata: cinco de burla qualificada, três de falsificação de documentos, um de fraude fiscal qualificada e outro de branqueamento de capitais.

A terceira sessão do julgamento está agendada para 26 de janeiro.