Benfica-Santa Clara, 4-1 Não há Félix, caça-se com Kokçu e Rollheiser (crónica)
Turco e argentino juntaram-se a Florentino e construíram um novo meio-campo, que ajudou nos equilíbrios defensivos e nos desequilíbrios provocados na defesa contrária
Aos 21 segundos, Nicolás Otamendi fez tudo o que não devia. Desconcentração no controlo da profundidade e reação corporal bizarra a uma bola longa e alta a apontar para a desmarcação de Vinicius, seguida por um falhanço estrondoso na tentativa de corte. No chão, só restou ao veterano argentino ver o avançado surgir isolado perante Trubin e festejar o 0-1, depois de ultrapassar o ucraniano com uma finalização subtil. Não podia começar pior a reestreia de Bruno Lage no Benfica e logo com uma péssima abordagem do seu capitão, que em vez de ser realmente um exemplo em campo tem acumulado erros atrás de erros nos últimos meses ao ponto de se ter de questionar a sua titularidade. Porque a experiência já não justifica tudo.
Nesse momento, ainda não tinha havido tempo para se perceber realmente como se desconstruía em campo o primeiro onze do novo treinador. Desta vez, sem João Félix para lançar, Lage tinha colocado em campo um 4x3x3, que contemplava Florentino a 6, Kokçu próximo, como um dos 8, mas mais à esquerda, sendo Rollheiser o outro, no canal à direita, talvez para compensar a maior fragilidade defensiva do compatriota Di María – um pouco ao jeito da dinâmica defensiva que Rodrigo de Paul cria com Messi na seleção argentina – e também para que ambos pudessem usar com maior facilidade o melhor pé por dentro nas jogadas de ataque, fosse no passe ou no remate. Além, naturalmente, das superioridades numéricas que pudessem criar mais à frente, com rotações posicionais.
O golo do empate, com os encarnados até aí a denotarem algumas dificuldades para controlar o jogo e criar oportunidades perante o 5x4x1 açoriano, surgiu aos 27 minutos. Uma ligação pelo ar Turkish Airlines, entre Kokçu, a usar o pé direito por dentro, e Akturkoglu, que, na enésima vez em que explorou o espaço interior, desviou de Gabriel Batista em jeito. E, sete minutos depois, já com Bruno Lage enérgico a incendiar as bancadas, as águias viravam o resultado. Com um cruzamento largo para o segundo poste, Di María ativou Otamendi, que se redimiu um pouco do golo sofrido, assistindo para… Florentino. O médio, último resistente de 2019/20, festejava o segundo remate certeiro com a camisola das águias, o segundo às ordens de Lage.
A equipa de Vasco Matos ainda assustou antes do intervalo, com Gabriel Silva a acertar no poste, aproveitando o espaço dado pelo Benfica à entrada da área, porém terá sido a última vez que Trubin se sentiu ameaçado, já que logo a seguir ao regresso dos vestiários António Silva (que tanto precisava!) desviou para baliza a segunda assistência de Kokçu (a melhor exibição desde que chegou à Luz?) na conversão exímia de um pontapé de canto.
Com o conforto do resultado e mais confiantes, os homens de Bruno Lage soltaram-se e desenharam finalmente um futebol mais associativo, empolgando as bancadas. O 4-1, aos 59, é uma obra de arte, com cumplicidade de Gabriel Batista pela hesitação e assinatura de Di María, num chapéu carregado de açúcar. Brilhante e, apesar de cedo, a garantia da entrada a vencer que a equipa e o novo treinador necessitavam.
Começou a ser tempo de gerir esforços, porque vem aí o Estrela Vermelha e uma Liga dos Campeões que promete ser dura, e depois o Bessa, e Rollheiser, Di María, Akturkoglu, Kokçu e Florentino foram rendidos por Amdouni, Prestianni, Schjelderup, Arthur Cabral e Barreiro. Mesmo assim, o quinto golo esteve próximo. O suíço e o norueguês falharam golos cantados, antes de o primeiro, num livre direto, ter acertado na trave, repetindo o azar que teve pela sua seleção frente à campeã da Europa Espanha.
Na quinta-feira, haverá novo teste, num ambiente muito mais opressivo, o do Marakana. A escalada da montanha ainda só agora começou. Bruno Lage terá plena consciência disso.