Áustria: o guia
Áustria (IMAGO)

EURO 2024 Áustria: o guia

INTERNACIONAL26.05.202412:00

Texto de Andreas Haguenauer, que escreve o 'Der Standard', publicado no âmbito da Guardian Experts' Network, a rede de troca de conteúdos para o Euro 2024, liderada pelo jornal inglês 'The Guardian' e que tem A BOLA como representante português

Expectativas

Tudo parecia demasiado bom para ser verdade: a Áustria impressionou na qualificação, segurando o 2.º lugar do grupo, atrás da Bélgica, e depois de uma vitória amigável frente à Alemanha já era praticamente campeã europeia. Depois, de repente, sofreu mais golpes do que um pugilista: a sua estrela, David Alaba, estava de fora do torneio com uma lesão grave; o treinador, Ralf Rangnick, foi associado a uma transferência para o Bayern de Munique; e o jogador-chave, Xaver Schlager, também foi afastado do torneio.

E agora? Alaba vai mesmo falhar o Euro, mas Rangnick continua comprometido à Áustria – e incluiu o defesa do Real Madrid como um capitão que não vai competir. «Falei muito com o David; ele quer realmente fazer parte da equipa», explicou. Pode ser uma boa decisão, mas a euforia pré-torneio a modos que desvaneceu na Áustria.

Ainda há esperança num bom torneio, mesmo assim, apesar dos percalços e de um grupo difícil. Um bom espírito e uma certa imprevisibilidade podem levar esta equipa longe. Com a Áustria, Rangnick modificou o seu 4x4x2 predileto, e confia sobretudo no 4x2x3x1. Estrategicamente a imagem de marca continua a ser a pressão alta, transições rápidas e corrida de alta intensidade. Rangnick implementou essa filosofia durante anos (em Salzburgo e Leipzig), e ficou conhecida pela filosofia da Red Bull.

O próprio Rangnick, contudo, não lhe chama isso. «Na minha opinião não há algo como o futebol da Red Bull», disse. «Sempre foi claro que jogamos um futebol que se foca no controlo, independentemente de quem tiver a posse. A única forma para o fazer é com um plano definido».

Exigências elevadas e precisas são colocadas em cada jogador, mas cada um sabe o que tem de fazer. O treinador também quer que os jogadores se responsabilizem. «Um bom treinador transfere a sua visão futebolística para os corações e mentes dos seus jogadores», disse.

Como a equipa vai lidar com as expectativas será um elemento importante neste verão. Uma boa prestação não será uma surpresa, mas onde isso os irá levar é de todo incerto.

O selecionador

Ralf Rangnick, atual selecionador da Áustria (IMAGO / Kirchner-Media)

Parece que a Áustria e Ralf Rangnick são um casamento perfeito. O técnico de 65 anos assumiu o comando após a saída de Franco Foda, imprimindo o seu estilo e levando a que os bons resultados deixassem de ser coincidência. Não é fácil para um alemão ser adorado na Áustria, mas Rangnick deu-lhes o futebol que há muito desejavam, conquistando o coração dos mesmos. E quase que o partiu, também, quando começaram a sair os rumores de que estava de saída para o Bayern de Munique. O alívio foi tanto quando anunciou que ia ficar. É um selecionador de instruções claras e um homem de palavras, o que é apreciado na Áustria. Numa entrevista discutiu o clima, a pobreza, a guerra e a migração, refletindo nas realidades políticas da Áustria e Alemanha. «Vejo o perigo da extrema-direita a chegar ao poder, ao prometer soluções simples para problemas complexos.»

O ícone

Marcel Sabitzer (IMAGO)

Marcel Sabitzer consegue reiventar-se continuamente. Depois de prestações impressionantes pelo Leipzig, mudou-se para o Bayern, no qual teve dificuldades para se impor, e a fortuna foi mais ou menos a mesma durante o empréstimo ao Manchester United. Alguns questionaram se o médio estaria em declínio. Contudo, a sua transferência para o Borussia Dortmund serviu para se afirmar de novo, tendo um papel fundamental na equipa que chegou à final da Liga dos Campeões. Fora dos relvados, Sabitzer não é o mais barulhento, nem gosta de fazer manchetes. Mas no campo faz a diferença. E, com a ausência da David Alaba, terá mais responsabilidade com a Áustria, neste verão.

Para ter debaixo de olho

As carreiras requerem, por vezes, paciência. Nicolas Seiwald precisou de muita, não tendo o tempo de jogo que quereria pelo Leipzig. Ainda assim, o médio defensivo é um sonho para qualquer treinador; emula tudo o que se pode querer nessa posição. O jogador de 23 anos joga de forma direta, mas eficaz, raramente comete erros e pode ditar o ritmo e a velocidade do jogo, algo excecional para a sua idade. É uma questão de tempo até estar sob a ribalta.

Espírito rebelde

Arnautovic (IMAGO)

Nenhum jogador, exceto David Alaba, moldou tanto o futebol austríaco na última década quanto Marko Arnautovic. É um homem que desperta sonhos e os destroça, um jogador cujo talento entra em campo antes dele, alguém que consegue fazer tudo mas precisa de fazer pouco, e agora tem finalmente o seu grande título da Serie A com o Inter. Arnautovic é muita coisa; acima de tudo, não deixa ninguém diferente – goste-se dele ou não. No campo é imprevisível, é o homem do incomum e do especial. Às vezes, um toque ou uma entrevista são suficientes para elevar o seu estatuto.

A espinha dorsal

A Áustria está a lidar com as baixas do guarda-redes Alexander Schlager, do defesa David Alaba e do médio Xaver Schlkager, então é possível dizer que se retirou boa parte da espinha dorsal da equipa. Contudo, Patrick Pentz vai dar uma boa segurança na baliza. Substituir David Alaba na defesa é impossível, mas Stefan Posch, que ajudou o Bolonha a qualificar-se para a Liga dos Campeões, é esperado que seja a âncora da defesa no lado direito. No meio-campo, Konrad Laimer, do Bayern de Munique é, agora, mais crucial do que nunca; a sua qualidade é indispensável. Na frente tudo depende de Michael Gregortisch. O avançado é responsável por marcar e criar espaços. Um jogador que vive de confiança e Rangnick providenciou-a.

Onze provável

4x2x3x1: Pentz - Mwene - Danso - Wöber - Posch - Seiwald - Laimer - Sabitzer - Schmid - Baumgartner – Gregoritsch.

Adepto famoso

As contribuições da Áustria para o mundo das estrelas têm sido modestas, pelo menos desde Falco, e Arnold Schwarzenegger também não liga propriamente ao futebol. Christopher Waltz também parecer ter coisas mais interessantes para fazer, pelo que é preciso escavar um pouco mais. O vídeo viral de Maradona a aquecer, nos tempos de Nápoles, tem como banda sonora a banda austríaca Opus, com ‘Live is Life’. O vocalista, Ewald Pfleger, é adepto do clube Grazer AK.

Petisco

Há combinações que foram feitas para estar juntas: a seleção e Ralf Rangnick, David Alaba e a Liga dos Campeões. Do desporto para a cantina, há outra: a Áustria adora a combinação de carne e pão, em todas as formas. É tão humilde como um Wurstsemmel, reverenciado na Áustria. Salsicha e pão. As possibilidades parecem tão simples, mas são infinitamente complexas. Mete o futebol na equação e podes falar quase de uma Santa Trindade.