«A qualquer momento, o SC Braga pode ser campeão»
Agora na segunda divisão marroquina, o técnico português Jorge Paixão, que já treinou os bracarenses, fala a A BOLA sobre como é viver e treinar em países com culturas tão distintas como Marrocos, Kuwait ou Ruanda, bem como da importância que tem, para si, o trabalho social que desenvolve pelos sítios onde passa
Neste momento, representa o Difaâ Hassani de El-Jadida. Pedia-lhe que contasse um pouco sobre o clube e sobre como surgiu esta oportunidade.
- O Difaâ tem muita história em Marrocos. É um clube de primeira liga e representa uma província grande do país, mas desceu à segunda divisão. É como se SC Braga ou Vitória de Guimarães descessem à segunda liga. Têm uma massa adepta muito fervorosa e condições de trabalho muito boas. Estive próximo de ir para a Indonésia. Já tínhamos negociações avançadas, mas o clube surgiu de forma rápida. Escolhi ficar aqui, pelo projeto apresentado, pela grandeza do clube, mas também pela proximidade a Portugal.
- Treinou no Catar, Ruanda, Polónia, Kuwait e, agora, Marrocos. Como é viver com estas diferenças?
- Há diferenças. Aqui, a cultura é árabe-africana. Marrocos é um país mais aberto, não tanto como Portugal, mas mais aberto que o Kuwait ou o Catar. São culturas diferentes, que nos enriquecem. Temos também a questão das rezas: temos de conseguir adaptar o treino à hora das rezas.
- Como se lida com as rezas?
- Têm esses hábitos, que temos de respeitar. Desde que saí de Portugal, adaptei-me ao país para onde ia, à vida lá, isso é fundamental. Depois, no futebol, temos de adaptar-nos e, a pouco e pouco, mudar uma coisa ou outra. Não podemos chegar e mudar tudo de repente.
- Que tipo de alterações tenta promover?
- Por exemplo: os horários. Os países árabes não são tão rígidos com os horários. Depois, é a organização. Não é habitual lá ser-se tão rigoroso e é importante fazermos perceber que, com as coisas bem organizadas, estamos sempre mais próximos do sucesso.
Jorge Paixão numa das ações de solidariedade, na altura, no Ruanda.
- Como vê a sua carreira?
- Comecei a trabalhar nos distritais, passei por todos os escalões, lancei vários jogadores que chegaram a internacionais A, tanto em Portugal como nos países por onde passei. Tenho um título importante na Polónia, a Supertaça, tenho subidas de divisão e uma carreira que me orgulha. O futebol deu-me tudo, também me tirou algumas coisas, mas faz parte. Paralelamente a isto, embora não seja algo de que costume falar, mas gosto de dizer, por vezes: quando estou fora, faço trabalho social com crianças. É algo que me apaixona. Tenho visto tanta dificuldade. Venho para fora para melhorar a minha vida, também financeiramente, mas deixo igualmente a minha marca com esse trabalho social. Sou treinador de uma equipa de uma província grande, se a minha ação pode fazer alguém feliz, então tento fazer isso.
- Teve uma passagem, ainda que curta, pelo SC Braga. O que recorda e como vê o clube hoje?
- O SC Braga é um grande clube. Desde que lá estive, há 10 anos, já cresceu muito. O presidente Salvador tem feito um trabalho extraordinário e, neste momento, tem um plantel ao nível dos grandes e considero que, a qualquer momento, o SC Braga pode ser campeão.
- Treinou Rafa, que está num grande momento de forma…
- Já era um jogador diferenciado. Havia aspetos que tinha de melhorar, mas tornou-se um jogador de topo. Sempre teve a rapidez de execução, era muito forte no ataque à profundidade. Aprimorando a finalização, tornou-se um jogador de topo e tem condições para jogar em qualquer campeonato do mundo. Agora, poderá ser a sua última oportunidade de sair para uma liga de topo e isso deixava-me muito feliz, não só porque é um grande jogador, mas também porque é um rapaz muito humilde e sério no trabalho.
- Acompanha a Liga portuguesa? Que análise faz desta época?
- Sim. Tem sido um campeonato competitivo. O Sporting está mais forte. O Benfica parece estar a estabilizar, o FC Porto não tem estado tão bem, mas a qualquer momento pode lutar pelo título. O SC Braga, como disse, é um grande clube que está a competir pelo topo. A aposta no treinador português tem sido positiva. Apenas Benfica e Vizela não têm treinadores portugueses. Vê-se, nos jogos entre equipas mais em baixo na tabela e os chamados grandes, que já não há uma diferença tão grande, porque há bastante qualidade no jogador e no treinador português.