ALLIANZ CUP A formiga amarela e a cigarra vermelha: crónica do Benfica-Estoril
Benfica chegou ao jogo com 20 minutos de atraso. Há nos encarnados quem só jogue com bola. Indiscutível: Estoril merece esta final!
Será a final improvável. Porque o Sporting parecia estar mais forte do que o SC Braga e porque o Benfica será sempre favorito quando tem por adversário o Estoril. A verdade é que será uma final entre os que mais lutaram e melhor souberam gerir as contingências de um jogo de futebol. Aliás, será, também, uma final de homenagem ao futebol. Porque é uma final inédita e porque terá no Estoril um finalista surpresa e que provou no jogo com o Benfica que a superioridade tem de ser demonstrada dentro do campo e que o trabalho, a organização, o rigor podem compensar a diferença de classe. Ontem, em Leiria, o suor do esforço teve sucesso sobre o perfume dos ociosos. Não deixa de ser uma mensagem didática. Como também será educativo regressarmos à velha história de infância da formiga e da cigarra. A formiga vestiu de amarelo e a cigarra de vermelho. Tal como no conto infantil, no final, a formiga recebeu o prémio da sua atitude e a cigarra chorou o tempo em que andou a vadiar pelo campo.
O respeito e o desrespeito
Nos primeiros vinte minutos de jogo, o Benfica esteve, pura e simplesmente, ausente. Alheado do jogo e num desrespeito inaceitável pelo adversário e pelo público. Pelo contrário, o Estoril respeitou, por inteiro, o futebol, a começar pelo excelente trabalho de casa de Vasco Seabra, que soube entender o jogo antes de o jogar, estabeleceu um plano, levou os seus jogadores e desenvolverem-no com profissionalismo e rigor.
O Estoril não chegou à vantagem (16 minutos) por um lance de acaso. O Estoril conseguiu o golo num período de jogo em que esteve por cima e soube aproveitar a falta de pressão do Benfica, a sua indolência, a sua falta de chama.
Foi um golo precioso que viria a marcar o jogo. Porque o Estoril trouxe a decisão para o que mais desejava. Defender bem, com uma linha subida para encurtar espaços, obrigando o Benfica a jogar como não gosta, em poucos palmos de terreno, e sair rápido para o contra ataque ganhando vantagem nos flancos descobertos.
Schmidt - horror à mudança
Será, talvez, uma questão cultural, ou apenas uma convicção assente na sua conceção de jogo, mas a verdade é que Schmidt é um treinador com horror à mudanç a. Nada parecia poder justificar que o Benfica não mudasse ao intervalo. Tudo corria mal e continuando a achar normal continuar a ter na equipa jogadores que só jogam quando têm a bola no pé, seria recomendável passar em ter em campo jogadores com outra atitude, que pudessem, enfim, ser parceiros úteis de João Neves ou de Otamendi. Nada. Apenas uma crença em que por milagre surgisse um oásis no deserto. E, na verdade, surgiu, num lance em que só Otamendi acreditou. Chegava, assim, o empate e com ele uma ideia de outro futuro para aquele jogo.
Mas nem por isso. Cirurgicamente, o treinador do Estoril continuou a mexer bem na equipa, recusando vassalagem defensiva, mantendo uma ideia clara de que pretendia também chegar ao golo. Quanto a Roger Schmidt, uma primeira decisão, sem rasgo, apenas de jogador por jogador, em cima dos 70 minutos e só na reta final do jogo uma mudança estrutural, com a estreia de Carreras para a ala esquerda, procurando a velocidade que Morato não podia dar, e com o recuo de João Mário para a zona central do meio campo.
Velocidade ofensiva, era, de facto, uma arma de que o Benfica precisava, como de pão para boca, para poder desmanchar a magnifica teia criada pelo Estoril. Tanto mais que não podia contar com o engenho e a arte de Di Maria a merecer um descanso precoce. Mas já era demasiado tarde. O Estoril soube estender o jogo até aos 90+6 e só quando esperava pelo apito do árbitro sofreu um enorme calafrio, quando Di Maria, farto de andar desaparecido no jogo, conseguiu a ironia de um remate de classe, levando a bola ao poste.
Vieram os penaltis e o Estoril voltou a ser mais competente, qualificando-se, com mérito, para a sua primeira final da Taça da Liga.